São Paulo, domingo, 24 de junho de 2007

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

"O divórcio me fez sentir inteira"

ITALO NOGUEIRA
DA SUCURSAL DO RIO

A primeira mulher a se divorciar no país, segundo jornais da época -em 28/12/77-, diz ser a responsável por mais de 20 mil casamentos.
Juíza de paz há 34 anos, Arethuza Figueiredo Henrique Silva, 68, considera o desquite uma "hipocrisia" e diz que o divórcio a fez se "sentir inteira".
Quase 30 anos após se separar do bancário aposentado Francelino França Ribeiro, 71, Silva "tentou ser feliz com alguém mais uma vez", mas não conseguiu. Separou-se novamente, após 16 anos de vida com seu segundo marido.
"O ideal é encontrar a pessoa certa, no momento certo. Mas nem sempre acontece." Ela diz ver mais sinceridade nos casamentos pós-lei do divórcio.

 

FOLHA - Qual foi o motivo da primeira separação do Brasil?
ARETHUZA HENRIQUE SILVA -
Na realidade, já éramos separados havia sete anos /.
No casamento tem que existir amor, respeito e diálogo. Não estou falando mal dele /. Conversamos até hoje. Mas não deu certo.

FOLHA - Como sua família reagiu à separação?
SILVA -
Fui criada de uma forma muito repressiva. Minha mãe era muito religiosa. Não admitia a separação nem nenhum deslize de conduta. Meus pais não apoiaram /. Mas eu vi que, se eu fosse hipócrita, seria infeliz, e ele também.
Foi muito difícil. Eles tinham uma idéia muito arraigada em relação ao casamento, de que se deveria carregar a cruz até o final. Mas não era rebeldia, era uma questão de viver melhor.

FOLHA - A lei do divórcio fez bem para a sra.?
SILVA -
O divórcio fez eu me sentir inteira. Sentia-me vinculada, faltava liberdade. A desvinculação total faz com que você tenha opções na vida. O ideal é encontrar a pessoa certa, no momento certo. Mas nem sempre acontece.
Mas sempre deixa cicatriz. Alguém deixa de ver os filhos todos os dias... É um problema.
Só que o desquite era uma hipocrisia. Você se separava e não tinha a desvinculação. Era uma coisa muito incômoda. Ninguém era livre de coisa nenhuma. Os filhos da segunda união eram muito criticados.
A lei veio fazer justiça aos filhos da segunda união.

FOLHA - E como a sra. soube da nova lei do divórcio?
SILVA -
Eu já acompanhava a discussão sobre ela. Era amiga do / Nelson Carneiro e participei de um debate na / Tupi sobre o tema. Assim que saiu a lei, ele / concordou em assinar o divórcio. Mas não havia nenhuma briga.
FOLHA - Como juíza de paz, como foram os dias posteriores à nova lei?
SILVA -
Celebrei casamentos de várias pessoas que se divorciaram para formalizar a união.
O caso mais emocionante foi o de um casal de senhores de 82 anos, com filhos e netos emocionados. Foi uma cerimônia muito bonita. Muita gente aproveitou a nova lei para formalizar o casamento.
As pessoas sonham com a estabilização, a aprovação social. A certidão de casamento, além dos problemas legais que resolve, é um marco definitivo /.
FOLHA - A sra. se casou de novo?
SILVA -
Tentei ser feliz com alguém mais uma vez, mas não consegui. Já estava com ele quando saiu a lei do divórcio e ficamos juntos 16 anos.
FOLHA - Qual a diferença entre os casais pré e pós-lei do divórcio, na sua opinião?
SILVA -
Por incrível que pareça, vejo mais sinceridade hoje em dia. Muitos já vivem juntos.
Naquele momento da cerimônia, vejo muitos jovens com um brilho no olhar, emoção. Isso me toca muito. Ser divorciada não quer dizer que não acredito no amor e na instituição do casamento. Queria que não tivesse acontecido, mas aconteceu.


Texto Anterior: Filhas do 1º divórcio divergem
Próximo Texto: "Emoções podem ser incompatíveis"
Índice


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.