São Paulo, Domingo, 26 de Dezembro de 1999


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Um mestre caloroso

Gilles Gaston Granger
especial para "Le Monde"



O filósofo Gérard Lebrun morreu brutalmente na sexta-feira, 10 de dezembro.
Nascido em Paris em 1930, Gérard Lebrun começou sua carreira no liceu franco-muçulmano de Argel (1955-1959), trabalhando a seguir no liceu de Rennes (1959-60). Depois, foi contratado como professor estrangeiro pelo departamento de filosofia da Universidade de São Paulo. Assim começou para Gérard Lebrun uma longa aventura brasileira; ele morou no país por seis anos, e retornou a ele frequentemente, tornando-se um dos melhores conhecedores da vida artística e mesmo da vida política brasileira.
Suas qualidades de filósofo e pedagogo, bem como o calor de seus contatos humanos, já eram reconhecidos desde sua passagem pelo ensino secundário, em particular em Rennes, por muitos amigos, depois tornados professores universitários. Por isso, foi convidado a apresentar sua candidatura a um cargo letivo na Universidade da Provença, sendo eleito em 1966. Mais tarde tornou-se professor assistente (1972) e titular (1976), até sua aposentadoria, no ano passado.
Suas duas teses foram defendidas e classificadas magna cum laude em 1971. A primeira era parte de seu trabalho sobre "Kant e o Fim da Metafísica", publicado em 1970 pela Gallimard. Lá, Lebrun reinterpretava de forma original e fecunda a crítica kantiana à faculdade do julgamento. A outra tese, que ele apresentou à banca de doutorado sob a modesta denominação "tese secundária", tinha por título "A Paciência do Conceito", e foi publicada em 1972, também pela Gallimard.
Nela, Lebrun trata de um tema a que voltaria constantemente em seus artigos e aulas: o discurso hegeliano. Uma vez mais, ele renovou a interpretação de uma obra filosófica, dessa vez a de Hegel. Além de numerosos artigos, ele publicou no Brasil uma coletânea de textos cartesianos e diversas obras em português, uma delas uma sequência à sua tese sobre Hegel, com o título "O Inverso da Dialética", e também um livro sobre Hume.
Não devemos separar o ensino, cuja influência foi extraordinária, da obra escrita de Lebrun, tanto no Brasil como em Aix-en-Provence, bem como na École Normale da rua d'Ulm, onde ele lecionava regularmente. A perda que a filosofia francesa, particularmente a história da filosofia, sofre com sua morte prematura é dolorosa. E o mesmo vale para seus amigos, franceses e brasileiros, que se esforçarão, cada qual em sua esfera, por manter viva a memória de Lebrun.


Gilles Gaston Granger é professor honorário no Collège de France.
Tradução de Paulo Migliacci.


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