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GIGANTE ASSIMÉTRICO
Crescimento chinês tornou o país comunista
um dos mais desiguais do mundo; incentivos ao
mercado retrocederam desde os anos 90
DE PEQUIM
Ao chegar a Pequim,
o visitante aterrissa
no maior aeroporto
do mundo. Desenhado pelo arquiteto Norman Foster, custou US$
3,6 bilhões [R$ 6,5 bilhões].
Dali pode chegar ao centro da
cidade por um trem de superfície. Verá avenidas com asfalto
impecável adornadas por jardins. O metrô, que tinha 140
km de extensão no início de
2008, chegará a 230 ao final
deste ano e a 420 km em 2012
(o de São Paulo tem 61 km).
Prédios novos dos arquitetos
mais famosos do mundo estão
espalhados pela capital chinesa, que parece mais rica que
qualquer cidade brasileira. Há
apenas 20 anos, Pequim era
mais conhecida pela onipresença de cortiços e pela ausência de carros nas ruas.
"O modelo chinês foi muito
bem-sucedido no crescimento
acelerado, na criação de milhões de empregos e em obter
resultados que outras ditaduras também populosas nunca
alcançaram", diz o economista
chinês Yasheng Huang, professor do Instituto de Tecnologia
de Massachusetts (MIT).
Em 1991, a economia da China era de US$ 400 bilhões
(equivalente ao Brasil de então). Ao final deste ano, o PIB
chinês terá crescido quase 11
vezes -no ano que vem, ultrapassará o Japão como segunda
maior economia do mundo.
O governo chinês tem US$ 2
trilhões em reservas internacionais e seu Ministério do Comércio tem organizado viagens
para comprar empresas na Europa e na Austrália (nenhuma
ainda na América Latina).
"Mas está na hora de melhorar esse crescimento, que não
se destrua o ambiente e que a
riqueza seja distribuída", diz
Yasheng, autor do livro "Capitalism with Chinese Characteristics" (Capitalismo com Características Chinesas). Apesar
do frenesi construtivo em Pequim, Xangai ou Guangzhou,
74% dos lares na zona rural,
onde vivem 730 milhões de
chineses, não têm geladeira.
Crescimento desigual
A desigualdade social disparou. A renda média em Pequim
é de 44,7 mil yuans por ano (R$
12 mil), enquanto no Tibete é
de 3.700 yuans. Entre os chineses que moram no campo, 54%,
a renda média é um terço daquela dos 46% urbanos.
A população assistiu a um
inédito progresso social (os pequineses tinham renda de
2.600 yuans em 1990, 15 mil
yuans em 2000 e 44,7 mil
yuans no ano passado), mas hoje a China é um dos países mais
desiguais do mundo. "Temos
um governo rico, com empresas estatais que não sabem o
que fazer com seus lucros, e
uma sociedade relativamente
pobre, com baixos salários", diz
o economista Andy Xie, colunista da revista "Caijing".
A abertura chinesa não foi
um processo uniforme. Teve
experimentações, das zonas
francas criadas por Deng Xiaoping para "testar o capitalismo"
à liberação dos camponeses das
fazendas coletivas.
Yasheng diz que nos anos 80
o empreendedorismo do povo
chinês foi liberado, mas que, a
partir do final dos anos 90, retornaram o estatismo e as barreiras para empreendedores.
Nos anos 80, a diáspora chinesa, de Hong Kong a Taiwan,
dos EUA a Cingapura, representou o primeiro grupo a se
arriscar a investir pesadamente
no país.
A China é o maior recipiente
de investimentos estrangeiros
do mundo nos últimos 20 anos
e, em vários rankings internacionais, tem a economia mais
aberta que no Brasil.
"A escala do mercado e o poder de decisão do Partido Comunista, que construiu uma gigantesca infraestrutura em tão
pouco tempo, atraíram o mundo", diz a consultora britânica
Jeanne-Marie Gescher, há 20
anos no país.
Para que tivessem acesso a
um mercado potencial de 1,4
bilhão de pessoas e à mão de
obra barata, o governo conseguiu arrancar transferência de
tecnologia e condições favoráveis de quase todas as multinacionais, além de decidir em que
cidades poderiam se instalar.
Novos desafios
Para o professor Yasheng, é
hora de tirar o monopólio do
Estado de diversas áreas e democratizar o acesso ao crédito.
O pacote de estímulo para a
economia de US$ 580 bilhões,
no ano passado, foi canalizado
principalmente para empresas
estatais (há 115 mil no país).
"O pequeno empresário que
precisa crescer não consegue
crédito ou fica nas mãos do
PCC para obter alguma ajuda",
diz Yasheng. "Virou um capitalismo oligárquico, ameaçado
por corrupção crua."
O setor de serviços ainda é
pequeno e o consumo doméstico representa apenas 35% do
PIB (metade do que na maioria
dos países desenvolvidos).
O PIB chinês deve crescer
8,3% neste ano e 9,5% em 2010,
mas o clima não é de fogos de
artifício. Segundo o primeiro-ministro chinês, Wen Jiabao,
"a China superou os desafios da
crise internacional com total
confiança, mas a estabilização e
a recuperação ainda não são sólidas e equilibradas".
O desequilíbrio da China
com o resto do mundo continua. Os americanos acusam o
yuan de ser artificialmente desvalorizado e governos de Brasil
e Índia a EUA e União Europeia
acusam a China de práticas ilegais no comércio.
As empresas chinesas continuam a receber mais incentivos para exportar e muitos dos
empréstimos do pacote governamental vão gerar mais capacidade produtiva.
Os especialistas concordam
que o ajuste da China passa por
menos exportações e mais consumo interno, que as estatais
devem retornar mais lucros ao
Estado, que investiria mais em
saúde, educação e habitação. O
país terá que fazer a transição já
feita por Japão e Coreia do Sul,
de elevar o valor agregado de
sua produção.
Mas, para o partido, a prioridade é de mais curto prazo:
continuar criando empregos
para os 15 milhões de camponeses que anualmente se mudam para as cidades e para os 6
milhões de formados pelas universidades chinesas -21 milhões de novos postos de trabalho por ano.
(RJL)
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