São Paulo, domingo, 27 de setembro de 2009

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O líder que a economia enterrou

Mao Tse-tung e suas ideias vão aos poucos sendo "apagados" da história da China

DE PEQUIM

A foto de Mao Tse-tung está espalhada em outdoors, pontos de ônibus e cartazes por Pequim para o lançamento do filme "A Fundação da República", superprodução chinesa que conta como os comunistas chegaram ao poder.
Para evitar qualquer concorrência, a distribuição de filmes do país (que é monopólio estatal) não deixou nenhum filme de Hollywood em cartaz. Milhares de ingressos foram distribuídos gratuitamente. Ainda assim, é um dos raros momentos em que Mao Tse-tung recupera protagonismo na China da última década.
Em 2006, a imprensa estatal praticamente ignorou os 30 anos de sua morte. Mao Tse-tung e o comunismo ficaram de fora da cerimônia de abertura da Olimpíada de Pequim, que enfatizou a história imperial chinesa.
Mao ainda tem sua face impressa em todas as cédulas de yuan (chamado de renminbi, "moeda do povo") e seu retrato ainda emoldura a entrada da Cidade Proibida, no centro de Pequim. Mas até o retrato vem perdendo centímetros, ano após ano.
"Discretamente e prudentemente, há uma desmaoização da China", diz o escritor e jornalista italiano Francesco Sisci, há 20 anos em Pequim. "Uma biografia crítica de Mao, escrita por Ross Terrill, foi traduzida e publicada recentemente pela editora da Universidade do Povo, que é estatal."
Seu sucessor, e rival no PCC, Deng Xiaoping, é mais citado atualmente pela mídia do governo, que repete algumas de suas tiradas, como "enriquecer é glorioso" e "não interessa se o gato é preto ou branco, contanto que pegue o rato", ou o termo "socialismo com características chinesas", quando começou a abrir a economia.

Criticado na escola
O encolhimento de Mao também acontece nos livros escolares. Alunos do equivalente à oitava série (entre 13 e 14 anos de idade) leem livros de história sobre a China contemporânea que só enfatizam o período compreendido entre a primeira Guerra do Ópio (1839-42) e a fundação da República Popular (1949).
No equivalente ao ensino médio, história se torna uma disciplina opcional, com ênfase em história mundial. No livro didático "Revisão e Comentários sobre Figuras Históricas Chinesas e Internacionais", Mao merece destaque em cinco das 106 páginas. Ainda assim, três de suas mais famosas campanhas políticas são criticadas.
O movimento contra direitistas é considerado "errôneo" pelo livro, que diz que o Grande Salto para a Frente "usou números falsos para inflar o resultado de colheitas" e que a Revolução Cultural "trouxe grandes perdas ao partido e à nação".
Como em várias outras áreas, a divisão entre a China urbana e a rural é grande quanto ao culto a Mao. Entre os camponeses, ainda é comum ter fotos já descoloridas de Mao na sala, reverenciado como um símbolo religioso e até como amuleto.
Oficialmente o partido não o demoniza e diz que seu legado foi "70% positivo, 30% negativo". Após sua morte, em 1976, sua mulher e três de seus principais assessores foram presos e condenados à prisão perpétua. Seu candidato a sucessor foi colocado de lado pelo reabilitado Deng Xiaoping.
"Para alguns setores do Partido, Mao ainda é estudado extensivamente, principalmente como estrategista militar, e deixam de lado suas tendências autocráticas e os desastres cometidos", diz o professor Victor Shih, da Universidade Northwestern.
"Ainda acho que ele será recuperado pelas novas gerações do partido". (RJL)


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