São Paulo, domingo, 28 de março de 2004

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MARINA SALEME
Brasil, 1958


"O QUE SEMPRE ME PERTUBOU FOI A SÚBITA PASSAGEM, O FIO QUE NOS SEPARA DA INEXISTÊNCIA, DO GRANDE VAZIO; A MORTE ESTÁ LIGADA À IMPOSSIBILIDADE DE CONTER"

De pinturas como "Enterrados" e "Deitado", de 1997, a instalações como "Ferida" (2001) e "Continentes" (2003), a morte perpassa, silenciosa, a produção de Marina Saleme. A última obra, uma parede recoberta por gesso e depois pintada de vermelho, com óleo vertendo de pequenas poças, sangra simbolicamente, fazendo irromper a consciência do desaparecimento, par e par com uma pulsão de vida, na medida em que a instalação cintila em sua presença irredutível.
(Juliana Monachesi)


"Eu trabalho com a idéia da instabilidade, fragilidade e impermanência física e emocional de todas as coisas. O que sempre me pertubou foi a súbita passagem, o fio que nos separa da inexistência, do grande vazio; o estar à beira do abismo.
A pintura me interessa pela fluidez do material, um tanto visceral, e pela captura do tempo, em camadas (como os dias, ou a vida). Como na constituição emocional dos seres humanos: todas as intervenções deixam marcas -visíveis e invisíveis. Mesmo as coisas que vêm a ser apagadas são constituintes da pintura.
A morte para mim está ligada à impossibilidade de conter; daí eu trabalhar com a idéia das coisas que vazam, escorrem, vão embora e morrem. Isso engloba desde emoções até fluidos vitais, a própria vida que também escorre do corpo, deixando-o inerte.
As figuras humanas têm uma materialidade e temporalidade suspeitas. A sua fragilidade, do ponto de vista pictórico, contém seu desaparecimento ou mesmo a possibilidade da não-existência. Nas paisagens que eu construo, as frágeis linhas tentam dar sustentação a um mundo que quer sempre verter sobre nós; ou mesmo constituir uma rede por onde ele não possa fluir ou desaparecer. O mundo que desaparece é a visão daquele que morre contra aquele que vê o desaparecimento do outro."


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