São Paulo, domingo, 30 de outubro de 2005

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Biblioteca básica

Guerra e Paz

BORIS SCHNAIDERMAN
ESPECIAL PARA A FOLHA

Eis uma obra que tem sempre algo a nos ensinar.
Já se consagrou a opinião de que se trata da grande epopéia moderna. Mas, se eu tomo a palavra epopéia no sentido dos dicionários, "poema de longo fôlego acerca de assunto grandioso e heróico" ("Aurélio"), "Guerra e Paz" aparece, antes de tudo, como uma anti-epopéia. Pois ali se desmascaram e se reduzem à simples condição humana os grandes mitos ligados às guerras em geral. Aparece então um verdadeiro achincalhe às representações grandiloqüentes da guerra popular e patriótica (veja-se o episódio da pilhagem de uma rica propriedade rural pelos camponeses), à auto-imolação que teria sido, em 1812, o incêndio de Moscou ocupada pelos franceses etc.
O que passa para o primeiro plano, em meio às vicissitudes de uma guerra, são os sentimentos e vivências pessoais. O grande mito do eterno feminino, encarnado por Natacha, aparece mais forte que todos os relatos épicos.
Não importa que seja impossível levar a sério, hoje em dia, a concepção de Tolstói sobre história ou sobre o papel dos grandes dirigentes de povos.
O que nos fica do livro, por meio de uma tessitura prodigiosa de argumento, é realmente uma epopéia, mas a epopéia do humano e familiar, nunca os clangores impingidos pelas leituras escolares.


Boris Schnaiderman é tradutor, crítico literário, escritor e fundador do departamento de russo da USP.

A obra
"Guerra e Paz", de Leon Tolstói. Trad. Gustavo Nonnenberg. 1.340 págs. Ed. Prestígio (esgotado).


Texto Anterior: Ponto de fuga - Jorge Coli: Legumes e defuntos
Próximo Texto: + autores: A tardia catarse cívica
Índice


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.