São Paulo, sábado, 09 de outubro de 2010

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ANÁLISE

FMI e Banco Mundial não conseguirão conter guerra cambial

Diante do quadro atual, o Brasil deve fazer todo esforço possível para não deixar a taxa de câmbio se apreciar

MÁRCIO HOLLAND
ESPECIAL PARA A FOLHA

Em estudo elaborado pela Liga das Nações, em 1944, o economista R. Nurkse defendia que a definição da taxa de câmbio não deveria ser deixada nas mãos das forças do mercado, pois a taxa cambial flutuante tenderia a ser volátil demais.
Mas ele argumentava também que ela não deveria ser deixada apenas na mão de governos individuais. Nada tão atual quanto essa preocupação.
Desde o acordo de Bretton Woods, em 1944, quando o mundo conheceu e defendeu as virtudes do regime de câmbio fixo, os EUA já experimentaram, por mais de uma vez, o clássico "dilema de Triffin", ou seja, precisaram, como agora, deixar sua moeda desvalorizar-se para corrigir desequilíbrios do balanço de pagamentos.
Com isso, porém, foi perdida a confiança na moeda internacional.
A política cambial pode ser entendida como o uso da taxa de câmbio para alcançar estabilidade de preços ou maiores taxas de crescimento econômico.
Seria de esperar que países considerados desenvolvidos, com elevados níveis de renda per capita e instituições maduras, não administrassem suas taxas de câmbio, até porque não costumam ter inflação nem mesmo precisam montar uma estratégia de crescimento econômico via uso da taxa de câmbio. Mas não é isso o que acontece.
A administração do câmbio seria comportamento típico de economias emergentes como a brasileira, que geralmente sofrem do "medo da flutuação"; ou sofrem do "medo da apreciação", como a economia chinesa.
Afinal, a taxa de câmbio é um poderoso instrumento de política econômica para alcançar baixas taxas de inflação ou altas taxas de crescimento, motivada por aumentos nas exportações.
O ajuste do mundo após a grande crise financeira de 2008 reeditou o debate à luz de um novo ator, a China.
Mais uma vez, economias desenvolvidas clamam para o ajuste global via economias emergentes (leia-se China), e suplicam que deixem suas moedas se apreciarem.

CORREÇÕES
Nesse processo, o Brasil está longe de ser o culpado, já que temos uma taxa de câmbio apreciada e volátil.
Em ambiente de anormalidade global, não cabe ao Brasil, com menos de 2% no comércio mundial, promover o ajuste para o mundo.
Cabe ao Brasil se proteger, pois estamos em uma guerra cambial já revelada e anunciada, que organismos internacionais frágeis como o FMI e o Banco Mundial dificilmente conseguirão mitigar.
Cabe ao Brasil fazer todo o esforço possível para não deixar a taxa de câmbio se apreciar.
Mas como? Para correções nominais no curto prazo, valem controles de capitais, quantitativos e qualitativos; se for o caso, valem até anúncios de pisos móveis e crescentes para a taxa nominal de câmbio.
No entanto, para correções na taxa de câmbio real de longo prazo, é necessário o anúncio de um importante e profundo ajuste fiscal com claras metas de superavit nominais, associadas a metas de expansão nas taxas de investimento público em detrimento das despesas correntes.


MARCIO HOLLAND é professor da Escola de Economia de São Paulo da Fundação Getulio Vargas (FGV), onde coordena o Programa de Pós-Graduação em Economia, e pesquisador do CNPq.


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