São Paulo, sábado, 09 de outubro de 2010

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice | Comunicar Erros

ANÁLISE AGRONEGÓCIO

Recuperação de preços agrícolas ameaça taxa de inflação no curto e longo prazos

GERALDO BARROS
ESPECIAL PARA A FOLHA

A recuperação em curso dos preços agrícolas é fruto do expressivo crescimento dos países emergentes e da conjunção de fatores climáticos que vem atingindo diversos países produtores.
Poderia se pensar que, se esses fatores climáticos fossem passageiros, em pouco tempo a subida dos preços estaria contida.
É preciso ter em conta, porém, que o mundo continua com liquidez elevada.
No Brasil, embora o câmbio valorizado amorteça o repasse dos aumentos do mercado externo, o nosso forte crescimento econômico, com o baixo desemprego e com reajustes salariais bem acima da inflação, também pode acomodar qualquer tendência de alta.
Em suma, o terreno é perigoso para choques de oferta em tempos de demanda firme. Se, por ventura, o movimento do câmbio mudasse de direção, poderia se perder a âncora controladora dos preços internos.
O foco da discussão do quadro macroeconômico brasileiro, porém, migrou da inflação para a taxa de câmbio, considerada exageradamente valorizada.
Nessa situação, o governo brasileiro faz coro a uma diversidade de países que veem na estratégia da China -de manter a paridade de sua moeda ao dólar americano- a raiz dos seus desajustes cambiais, com impactos deletérios sobre as suas contas externas e sobre setores menos competitivos.
Lembre-se, porém, que as recriminações à China se avolumaram a partir da crise financeira que derrubou as economias desenvolvidas, as quais, para aliviar os impactos recessivos, encharcaram de liquidez a si próprias e, bem assim, o mundo todo.
Até então, a política cambial chinesa era considerada bastante conveniente para muitos países, especialmente os desenvolvidos.
Para o Brasil, o yuan mantinha-se em níveis desconfortáveis, mas suportáveis. Agora, o desequilíbrio entre as moedas é sentido muito mais intensamente.
Resulta forte pressão para que as autoridades tomem alguma atitude abrindo sua caixa de ferramentas supostamente capazes de, unilateralmente, conter o ímpeto da entrada de moedas estrangeiras no país.
O mais provável é que se assista a um desfile de medidas que costumeiramente são lembradas nessas ocasiões.
Todas elas de eficácia duvidosa, como mostra a experiência e consideradas a atração que o país exerce sobre os capitais disponíveis em abundância internacionalmente, e a competitividade do Brasil nos setores mais ligados aos recursos naturais.
Neste momento em que as luzes se voltam para as turbulências financeiras, não se deve perder de vista o longo prazo, especialmente estando o país em meio ao processo eleitoral, em que são selecionados governantes e legisladores para os próximos quatro anos.
Para a agricultura -mais do que o controle do câmbio-, é essencial que seja mantida e fortalecida a estratégia que garantiu estabilidade de preços, melhorias na distribuição de renda e formação de um grosso colchão de divisas estrangeiras.
Os principais desafios são recuperar e expandir a infraestrutura; manter o crescimento de produtividade, para garantir preços baixos e preservação de recursos naturais; obter ganhos concretos nas negociações internacionais; e apoiar mais os produtores rurais, principalmente os menores, que não têm acompanhado a modernização do setor.
Como evidenciou o Censo de 2006, entre esses campeiam o analfabetismo, a falta de financiamento e de assistência técnica e o baixo nível de renda. Em síntese, a regra é: não descuidar da "galinha dos ovos de ouro".


GERALDO BARROS é professor titular da USP/Esalq e coordenador científico do Cepea/Esalq/USP.


Texto Anterior: Commodities: Santos tem novo terminal para açúcar
Próximo Texto: Vaivém - Mauro Zafalon: Estados Unidos fazem nova redução de safra
Índice | Comunicar Erros



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.