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ENTREVISTA
ARMÍNIO FRAGA
Sem mexer na Previdência, país terá crise no futuro
O ECONOMISTA, QUE PRESIDIU O BC ENTRE 1999 E
2002, DIZ QUE EDUCAÇÃO DEVE SER PRIORIZADA
SAMANTHA LIMA
DO RIO
Presidente do Banco Central entre 1999 e 2002, sócio
da Gávea Investimentos, o
economista Armínio Fraga,
52, afirma que, se o próximo
governo não enfrentar uma
reforma na Previdência, permitirá criar a base para uma
nova crise no futuro.
Fraga defende a imposição
de limite ao endividamento
do governo e diz que o Brasil,
hoje, é obrigado a desacelerar o crescimento porque,
além de investir pouco, deixou de cuidar da educação.
Leia os principais trechos
da entrevista.
Folha - O Brasil levou 40 anos
para voltar a crescer ao ritmo
do Milagre Econômico [de
1968 a 1973]. Agora, temos
que desacelerar para não gerar inflação. O que faltou?
Armínio Fraga - Investir
mais e educar melhor. Não
há país bem-sucedido que
não tenha feito esforço importante na educação ou que
tenha se desenvolvido só
com recursos naturais.
Está claro onde temos que
trabalhar para que a economia sustente um ritmo maior
de expansão, principalmente em infraestrutura.
Há investimentos estrangeiros previstos no Brasil em
energia, mineração, recursos
naturais. A tendência é duradoura ou apenas moda?
Os estrangeiros estão entusiasmados porque temos
passado pelas crises melhor
do que o nosso histórico.
Tem oportunidade na China,
na Índia, no Leste Europeu.
Mas somos o mais ocidental
dos emergentes, é mais fácil.
Às vezes o entusiasmo é excessivo. Não sou pessimista,
mas não podemos relaxar.
Caminhamos para um deficit
em conta-corrente maior, os
juros são altos.
Quando fala de juros,
o sr. vê como resultado da estrutura de dívida e gasto público, e não da atuação do BC,
não é?
Exatamente, o juro que o
BC controla sobe por questões estruturais. No longo
prazo, o trabalho do BC tem
ajudado a reduzir a taxa porque reduz a incerteza sobre o
país. Temos uma história
ruim, pressões fiscais. Isso
vai exigir um esforço de natureza estrutural.
Os dois candidatos à presidência mais bem colocados
nas pesquisas criticam ou já
criticaram a política monetária. O que podemos esperar?
Não vejo nenhum político
conectado com a realidade
disposto a se arriscar deixando a inflação subir. As pessoas sabem que inflação corrói o dinheiro, e os pobres
perdem mais.
O sr. vê ameaça à atuação do
BC no futuro?
Fala-se em aventura nessa
área, em função de declarações dos candidatos. Mas se
referem a circunstâncias extremas, e não ao dia a dia do
BC. O BC não tem independência formal, mas temos
autonomia operacional. Eu
aposto que isso continuará.
Que pergunta o sr. faria ao futuro presidente?
É uma pergunta antipática, que cabe a todas as lideranças do mundo: "Qual é
sua visão de um futuro fiscal
tranquilo para o país?".
Qual é o problema mais urgente a ser resolvido, na área
macroeconômica?
O crescimento do gasto
público.
E qual reforma institucional
relativa à área econômica deve ser tocada no início do próximo governo?
Reforçar a Lei de Responsabilidade Fiscal, impondo
limite à dívida pública federal, e incorporar a discussão
da previdência.
No caso da previdência, o sr.
acha que algo mudou?
Não, com tendência de
piorar, se o fim do fator previdenciário não for vetado. É
um tema difícil para um político, e não só no Brasil. O presidente Fernando Henrique
avançou, mas pouco porque
a oposição fez críticas agressivas. O envelhecimento da
população dos principais
países é uma questão gravíssima e não vem sendo discutida de forma razoável.
A previdência pode gerar crises no futuro?
Pode, sim. Lá fora já se vê
reação. Os governos da Alemanha e da França já discutem isso. A Europa levou
uma sacudida de confiança
nunca imaginada, mas vai
reagir positivamente.
A crise da zona do euro pode
ser debelada antes que extrapole para outras regiões?
Há riscos para nossa economia porque a Europa é o
maior mercado de nossas exportações. Temos deficit em
conta-corrente, e isso pode
dificultar o financiamento.
Com gastos do governo em alta, o BC está sobrecarregado
no controle da inflação?
O acompanhamento do BC
é um trabalho minucioso.
Chegou a hora de dar uma segurada, e por isso subiram os
juros para 9,5%. O anúncio
do corte de gastos pelo governo é positivo porque alivia a
inflação.
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