São Paulo, terça-feira 08 de abril de 2008

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Mercado

No meio do furacão

Marcas pequenas lutam para sobreviver na era das holdings de moda

por Camila Yahn

Enquanto a moda brasileira vive a euforia de um novo modelo de negócio, em que grandes grupos, sobretudo de investidores, estão adquirindo as grifes prestigiosas, os pequenos estilistas se encontram numa luta cada vez maior para sobreviver.

Para eles, uma das formas de criar prestígio no mercado, é desfilar nas semanas de moda. Eles fazem o possível e o impossível para que isso aconteça. No mínimo passam um estresse danado à procura de patrocínio e apoios. No máximo, cometem loucuras, como pegar o dinheiro que iria para a compra de um apartamento e investi-lo em um único desfile. Vale a pena trocar um apartamento por 15 minutos de exposição?

"Para mim valeu", diz a estilista Gisele Nasser, que desfila na SPFW. "Pelo menos eu tenho que acreditar que sim. Quem não desistiu da moda até hoje entende que os frutos vêm a longo prazo. "Um desfile não sai por menos de R$ 70 mil.

Quem não tem essa reserva precisa se virar de outro jeito. Wilson Ranieri, da mesma geração de Gisele e que também desfila na SPFW, conta que já precisou pedir dinheiro emprestado com amigos.

O estilista também pediu socorro a Clô Orozco, dona da Huis Clos, com quem trabalhou. "Uma vez tive problemas com os zíperes da coleção, e ela conseguiu de última hora para mim." Desde que entrou na SPFW, Wilson é patrocinado pela malharia Marles. "Temporada de moda me deixa de cabelo em pé!", diz.

Para a estréia da grife Amapô no evento, em janeiro passado, as coisas não foram fáceis. "Não conseguimos nada de patrocínio e também tivemos que usar todo o dinheiro que tínhamos. Ainda estamos trabalhando para pagar as dívidas do desfile", conta Pitty Taliani, uma das sócias e estilistas da marca.

Rita Wainer, que apresenta sua coleção no Fashion Rio, descobriu um caminho próprio. Ela, que já teve duas lojas em bairros nobres da cidade, transformou a internet na sua maior ferramenta de vendas e criou uma loja virtual. "Busco saídas e não acho humilhante não ter loja."

Os custos de um ponto próprio são altos, e Rita "já abria o mês devendo". "Procuro fazer as coisas de um tamanho que eu possa arcar. Minha filosofia é ter uma estrutura enxuta e ser livre", afirma.

Além de cuidar de suas marcas, os estilistas também trabalham na área de criação de grifes maiores como estilistas ou consultores. Até o ano passado, Ranieri trabalhava na Acqua Studio e investia o salário em sua própria grife. "Aproveitava para bancar um tecido mais caro. Eu era patrocinador de mim mesmo", brinca. Rita é a estilista da Ellus 2nd Floor, que junto com a Ellus, foi recentemente vendida e agora integra o grupo InBrands.

O maior problema para uma grife de pequeno porte é, sem dúvida, a falta de estrutura comercial. "Esse é o verdadeiro 'up grade' de uma marca: ter distribuição planejada, cumprir os prazos e contar com uma boa estrutura interna", diz Gisele. "Do tamanho que sou consigo chegar até um certo ponto. Com dinheiro, entramos numa outra dimensão de business."

Para Ranieri, "se está difícil para quem é grande, imagine para a gente". Ele exemplifica: "Vou na estamparia, sou sempre o último da fila. Na hora de comprar tecido, é exigida uma quantidade acima da que eu preciso. Em geral já sou descartado de início".

Todos vêem um lado positivo nessa nova era da moda brasileira, no sentido de que isso vai movimentar o mercado. "Acredito que não seremos esmagados e, sim, seremos um respiro", diz Rita. Carô Goldman, da Amapô, vê como uma boa saída exercer a função de diretora criativa para uma marca já existente. "É uma opção melhor do que simplesmente vender a grife e correr o risco de ela ser descaracterizada."

Na opinião de Paulo Borges, diretor criativo da SPFW, "o mercado vai crescer nesses próximos anos, e a tendência é que as marcas pequenas também busquem estruturação; será um processo natural".

Para os britânicos Stephen Morgan e Barbara Kennington, diretor e diretora editorial do portal de tendências WGSN, os jovens terão que se esforçar muito. "A única maneira de competir é trabalhar a diferença que eles têm em relação às grandes marcas. Mas o pior é tentar competir", diz Stephen. "A resposta é: entenda o seu mercado. E isso não significa que apenas os grandes irão ter sucesso. A moda precisa do frescor dos jovens."


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