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Refugiados defendem intervenção na Síria

Opção militar para conter Assad deixa de ser tabu e vira consenso entre os que escaparam do regime via fronteira turca

País vizinho já recebeu 12 mil exilados sírios; governo oferece tendas com rede de internet, TV e aquecimento

MARCELO NINIO
ENVIADO ESPECIAL A ANTAKYA (TURQUIA)

Distantes das altas rodas diplomáticas, descrentes da ajuda internacional e desesesperados diante dos massacres cometidos pelo regime, refugiados se organizam como podem, com uma única convicção: só uma intervenção militar estrangeira porá fim à violência na Síria.

Na fronteira com a Turquia, 12 mil sírios que fugiram da repressão vivem num compasso de espera angustiante, com pouca ou nenhuma notícia dos familiares que deixaram para trás.

Se há poucos meses falar em intervenção militar era quase tabu, hoje a opção é unanimidade. Numa região em que recentes ações estrangeiras, no Iraque e no Afeganistão, deixaram cicatrizes profundas na consciência coletiva, é uma virada e tanto.

A maioria dos refugiados vê com desconfiança as manobras do CNS (Conselho Nacional Sírio), grupo de exilados que tornou-se o principal interlocutor da oposição.

"O CNS só representa a ele próprio", diz o professor de engenharia Marwan Khatib, espécie de guru intelectual dos refugiados.

De maneira improvisada e com poucos recursos, eles se unem para dar ajuda humanitária, logística e militar aos que estão na linha de frente do levante contra o ditador Bashar Assad.

Um dos líderes informais dessa articulação em Antakya, cidade turca a 40 km da fronteira, é Mohamad Fezo, 33. A barba e os cabelos negros escorridos lhe dão aparência de versão abatida e mais magra de Che Guevara.

Fumando sem parar, Fezo encolhe-se de frio no apartamento sem calefação alugado pelos ativistas com dinheiro do próprio bolso, que serve de escritório para a recém-fundada Alta Comissão Síria de Assistência.

"Não dá mais para termos pudores. A única solução para parar a máquina assassina de Assad é uma ação estrangeira", diz Fezo, completando com uma frase que parece inimaginável para um árabe. "Não importa quem a faça, pode ser até Israel."

Enquanto fala, é interrompido a todo momento por telefonemas e um entra e sai constante no pequeno apartamento quase sem mobília.

Fezo comanda uma rede de ativistas que cuida de feridos, dá abrigo e comida aos recém-chegados e, sim, ajuda desertores do ELS (Exército Livre da Síria) a infiltrar clandestinamente armas, telefones via satélite e câmeras pela fronteira. Oficialmente, o governo turco não aprova o contrabando de armamento, mas na prática faz vista grossa.

ARMAMENTO

Uma das principais bases do ELS, numa área equivalente a três campos de futebol quase na fronteira, tem a proteção do Exército turco.

"Temos homens, temos dinheiro, só não temos armas", afirma Mohamad Ghazal, 33, um dos principais articuladores do Exército Livre da Síria. "Se o mundo nos armar, derrubamos Assad em um mês." O dinheiro, diz, vem de doações de sírios no exílio.

A poucos quilômetros estão seis campos de refugiados, que abrigam pouco mais de 10 mil pessoas (outras 2.000 estão na cidade de Antakya). Bancadas pelo governo turco, as condições são bem razoáveis, com aquecimento nas tendas, televisão por satélite e internet.

Em cada tenda, repetem-se os relatos de brutalidade do regime. Omar Radwan, 24, foi preso duas vezes. Solto, voltou a participar de protestos e acabou sendo baleado na perna e no braço. Agora, mal consegue andar.

Ficou dez dias escondido nas montanhas até cruzar a fronteira. "Deixei minha mulher e nosso filho de sete meses porque não tinha como trazê-los", diz o agricultor.

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