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Pirataria leva mais dinheiro à Somália do que exportações

Levantamento da Universidade Brunel aponta que o alto rendimento da prática corsária desestimula represálias

Pesquisadora afirma que intervenções no país devem vir acompanhadas de solução econômica

DIOGO BERCITO
DE SÃO PAULO

Com as planilhas de 2009 em mãos, é pouco provável que a elite da Somália olhe torto para os navios dos piratas que infestam sua costa.

O Orçamento de Puntland, Estado que reúne dois terços do território e da população do país, era de cerca de US$ 17 milhões naquele ano. A exportação de gado rendeu US$ 43 milhões no período.

Enquanto isso, a pirataria é responsável por gerar US$ 70 milhões -mais do que ambas as atividades somadas. Desse total, estima a ONU, 40% ficaram dentro do país.

A rentabilidade da prática corsária soma-se, segundo a economista Anja Shortland, à tradição somali de dividir os espólios entre as tribos.

Com o benefício estendido a grandes grupos da população, oferecendo uma saída para a pobreza crônica, não há incentivo para que os piratas abandonem os navios.

As conclusões estão no estudo "Treasure Mapped" (tesouro mapeado), publicado em janeiro pela Universidade Brunel, no Reino Unido.

Shortland analisou imagens captadas por satélite entre 2000 e 2009, tomando nota da quantidade de luz emitida à noite e das modificações feitas na infraestrutura de cidades da Somália.

"Não sou corajosa o suficiente [para fazer a pesquisa 'in loco']", afirma à Folha. Mas, diz, está interessada o bastante em descobrir quais são as maneiras mais viáveis de combater a prática criminosa que enxuga milhões de dólares do mundo e contribui para tornar a Somália um território inóspito e inseguro.

A saída, afirmou, é mapear quais áreas são menos beneficiadas pela pirataria e encontrar, ali, apoio para possíveis intervenções no país.

"Uma boa ideia seria começar pelas vilas costeiras", disse. Ela observou pouca melhora dessas áreas em comparação com as do interior.

Isso, é claro, após decidir-se sobre a melhor maneira de intervir. A via armada, observou, é uma opção só quando a comunidade internacional puder oferecer uma alternativa econômica às tribos.

"Você tem de levar em conta como essas pessoas irão viver", disse Shortland. A renda per capita anual na Somália é de US$ 600 (R$ 1.000). Estudos apontam que o pirata mais raso pode embolsar cerca de R$ 18 mil em um sequestro bem-sucedido.

As Nações Unidas estimam que, hoje, 3.500 somalis trabalhem no "ramo pirata".

O recorde de resgate é de US$ 9,5 milhões, entregue em 2010 para recuperar o navio coreano MV Samho Dream.

NEGÓCIO

A pirataria na Somália, em ascensão desde o final dos anos 2000, vem sendo estudada ao redor do mundo como atividade econômica.

Pesquisam-se os investidores, os custos operacionais e, é claro, o lucro do negócio.

"A população vê a pirataria como um crime sem vítimas", diz Shortland. "Muitas pessoas se beneficiam dele."

No entanto, ela nota que a atividade é "indefensável". Em 2010, 1.016 pessoas foram sequestradas por piratas. "Estão minando a possibilidade de governo legítimo."

Não apenas tribos somalis se beneficiam dos atos corsários. Shortland chama a atenção para os efeitos da pirataria nas economias ocidentais.

Apesar de a prática colocar em risco os navios que passam pelo canal de Suez, por onde escorre grande fatia do comércio mundial, há uma série de empresas especializando-se na segurança para esse trajeto específico.

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