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Campo de refúgio recebe mil sírios por dia

Domeez, no Iraque, tem capacidade para 10 mil pessoas, mas já conta com 25 mil fugitivos da guerra civil

Há espera para a obtenção de barracas, consulta com Médicos sem Fronteiras e para a utilização de fogões

RICARDO J. RODRIGUES
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA, EM DOMEEZ (IRAQUE)

No norte do Iraque, o campo de refugiados de Domeez é um retrato visível da guerra civil na vizinha síria, que já se arrasta há 18 meses. O local abriga de forma improvisada 25 mil pessoas.

Kerya Ismail, 47, chegou neste mês, com seus quatro filhos -e mais nada.

"Quando as tropas do governo começaram a bombardear Damasco, corri com as crianças para o abrigo, mas meu marido, que estava na rua, foi atingido por estilhaços. Ele acabou morrendo, e eu fiquei sozinha, com quatro bocas para alimentar."

No dia do enterro de seu marido, outro dilúvio de bombas caiu sobre Damasco. Ismail não teve dúvidas: "Peguei os garotos e fugi".

Para evitar a perigosa rota de fuga pelo sul, Ismail atravessou todo o país até a fronteira de Silbi, no norte.

"Peguei ônibus e caronas, andei em carroças e boleias de caminhões. Aí, meu filho mais novo [de 5 anos] adoeceu. Quando chegamos à fronteira, não havia clínicas, nem sequer um quarto livre."

Uma semana após sua chegada a Domeez, Ismail ainda esperava por uma barraca. "Deram-me logo comida e bebida, mas nunca sei onde vou dormir a cada noite", diz.

Até meados de agosto, Domeez recebia 500 pessoas por semana. O índice subiu para mil por dia neste mês. "Estamos atingindo uma situação insustentável", disse à Folha Bushra Alepota, chefe do Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados (Acnur) no norte do Iraque.

"Planejamos esse campo para 10 mil pessoas. O estoque de mantimentos previsto para durar até dezembro acabará muito antes disso", declarou.

Domeez ocupa um antigo quartel militar. Um campo de futebol próximo à área já foi anexado ao local, que terá que se expandir mais nos próximos dias.

Longas filas para qualquer coisa são parte da rotina. É preciso fazer fila para obter o registro de chegada, para conseguir fogões e comida e para se consultar com integrantes dos Médicos sem Fronteiras, que instalaram um posto de atendimento.

CANSADOS DE ESPERAR

No dia em que a Folha visitou o campo, na semana passada, a multidão que aguardava por uma barraca, cansada de esperar, invadiu o escritório da Acnur.

"Gostaria de ajudar a todos, mas não tenho nenhum abrigo para oferecer", dizia o funcionário Sarmed Amedi.

A alemã Anja Wolz, que trabalha há dez anos com a ONG Médicos sem Fronteiras, lamenta a falta de psicólogos no campo para assistir os refugiados.

"Aqui há um sério problema de saúde mental, com pessoas que viram as próprias famílias serem executadas, os vizinhos serem bombardeados. Os casos de depressão e trauma são muitos, devíamos estar também ouvindo as pessoas."

Em sua ronda pelo campo, Wolz encontra Asad Aziz, que tem duas vértebras partidas e mal consegue andar.

Ele conta ter participado dos primeiros motins de Aleppo, a cidade mais populosa e capital econômica da Síria.

Apanhado pelas forças do regime do ditador Bashar Assad, foi atirado de uma ponte. "Atravessei a fronteira carregado, nem sei como consegui passar", diz.

"Agora me diga: como terei forças para lutar com toda essa gente por água, comida e uma barraca para dormir?", indaga.

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