São Paulo, quinta-feira, 01 de janeiro de 2009

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entrevista

"A chance de acordo de paz é quase zero"

CLAUDIA ANTUNES
EDITORA DE MUNDO

Depois de trabalhar 20 anos no Departamento de Estado dos EUA, como negociador do conflito entre israelenses e palestinos, Aaron David Miller acaba de lançar seu quarto livro, "The Much too Promised Land" (a terra muito prometida). Nele, seguindo uma tradição de especialistas que trocam o governo pela academia, Miller faz uma autocrítica do viés pró-Israel de Washington nas negociações.
Mas ele não vê perspectivas de mudança nisso. Hoje no Centro Woodrow Wilson, em Washington, Miller diz, por telefone, que o ataque israelense a Gaza reduziu a "quase zero" as perspectivas de um acordo com os palestinos.

 

FOLHA - Vários moderados, em Israel e nos EUA, vinham instando Obama a lançar uma ofensiva diplomática para salvar a ideia dos dois Estados. Como o ataque israelense vai afetar as negociações?
MILLER -
Vai reduzir uma perspectiva já muito pequena para perto de zero. Eu nunca acreditei, mesmo antes dessa operação, que seria possível ter um acordo entre israelenses e palestinos agora. Mas a ação israelense tornará as coisas mais difíceis. E, mesmo que isso não acontecesse, as três principais razões pelas quais um acordo final entre Israel e os palestinos não é possível agora vão ser agravadas pelo ataque. A primeira é um movimento nacional palestino dividido. Mesmo se o Hamas ficar enfraquecido, isso significará que [o presidente da Autoridade Nacional Palestina, Mahmoud] Abbas agora será capaz de impor uma posição negociadora? Duvido. A segunda são os temas da negociação em si, Jerusalém, fronteiras, segurança. Há diferenças enormes entre os dois lados em cada uma dessas questões. A terceira é a própria indecisão de Israel. O país vota em de fevereiro e não há consenso sobre o preço a pagar por um acordo. E aí você tem o comportamento de Israel não relacionado a necessidades de segurança, como a intensificação da colonização [da Cisjordânia], o confisco de terras, a demolição de casas [de palestinos]. Tudo isso continua.

FOLHA - Obama pressionaria Israel a parar com isso?
MILLER -
Não, a menos que ele tenha a oportunidade de conseguir alguma coisa. Se ele sentir a perspectiva de um rompimento do impasse, então, como aconteceu nas poucas vezes em que um governo americano foi duro com Israel, ele vai atuar. Mas ele não irá contra Israel por princípio, e vai dar a Israel, no que concerne à segurança, um tremendo raio de ação.

FOLHA - A própria ideia dos dois Estados ameaça morrer..
MILLER -
É verdade. Mas nada pode superar os problemas que enfrentamos. Não é possível pacificar o movimento nacional palestino nem convencer os israelenses do preço que terão de pagar. Nem os EUA estão dispostos a ser duros e justos.

FOLHA - Há a possibilidade de os EUA aceitarem um governo palestino que inclua o Hamas?
MILLER -
Teoricamente sim, mas não acredito que um governo Obama fará isso. Os palestinos é que têm de tomar a decisão-chave de adotar uma posição negociadora unificada, dentro do seu movimento nacional. Ninguém fará isso por eles.


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