São Paulo, domingo, 02 de junho de 2002

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8h 46 - 91º andar, torre norte, Uma hora e 41 minutos antes do desabamento

O impacto aconteceu às 8h46m26s. O avião do vôo 11 da American Airlines, um Boeing-767 medindo 47,5 metros da ponta de uma asa à ponta da outra e carregando 38 mil litros de combustível, estava andando a 750 km/h, conforme estimativa dos investigadores federais. Nessa velocidade, o avião cobriu os dois quarteirões finais que o separavam da Torre Norte em 1,2 segundo.
O avião abriu um rombo formando um caminho que atravessou do andar 94 ao 98, indo parar diretamente no escritório da Marsh & McLennan Companies e, em seu percurso, destruindo colunas de aço, paredes, arquivos e mesas carregadas de computadores. Seu combustível incendiou e incinerou tudo o que encontrou em seu caminho. O trem de pouso do avião se desprendeu e foi arremessado, atravessando a lateral sul do edifício e indo parar na rua Rector, a cinco quadras de distância.
Três andares apenas abaixo da zona de impacto, nem um objeto saiu de seu lugar no escritório de Steve McIntyre, da empresa American Bureau of Shipping (ABS). O peso de papel feito de ardósia, no formato de um barco a vela, ficou imóvel. As fotos de família apoiadas numa estante de livros continuaram em seus lugares. McIntyre se viu diante de um computador que continuava ligado.
Então veio a reação retardada.
Uma poderosa onda de choque irradiou-se rapidamente a partir da zona de impacto, subindo e descendo. A onda rebateu do alto para a base da torre, levando três a quatro segundos para ir e então voltar, agitando o prédio como se ele fosse um enorme barco solto numa tempestade.
"Temos de sair daqui já", gritou Greg Shark, engenheiro e arquiteto da American Bureau of Shipping, firmando-se para resistir à ondulação em frente ao escritório de McIntyre.
De alguma maneira, eles estavam vivos. Apenas mais tarde é que os dois se dariam conta de como foi pequena a chance de escapar que eles conseguiram aproveitar. Nos relatos que fizeram de como procuraram uma saída, forneceram um mapa de um território de fronteira, uma zona inexpugnável pela qual as pessoas presas nos andares de cima jamais conseguiriam passar.
McIntyre, Shark e nove outros funcionários, nenhum deles ferido, saíram rapidamente da área de recepção da ABS, no canto noroeste do edifício, e viraram à esquerda, em direção aos elevadores e às escadas que havia no centro da torre.
McIntyre se recorda de ter olhado por um poço de escada escuro, repleto de fumaça e despedaçado. O único som que ouvia era o de água jorrando escada abaixo, como se tivesse topado com um riacho borbulhante durante uma caminhada nas montanhas. A água quase certamente vinha dos canos quebrados do sistema de combate a incêndios. Como não via nem ouvia mais ninguém no meio da escuridão malcheirosa, olhou para cima.
O poço da escada estava bloqueado desde acima -não pelo fogo ou por aço que fizesse parte da estrutura da torre, mas por pedaços enormes do revestimento de gesso que recobria as paredes laterais da escadaria. Caído em pedaços enormes, o gesso tinha bloqueado o poço da escada, fechando a passagem entre o 91º e o 92º andares. Do 91º para baixo, o gesso era um obstáculo menor.
"Isso aqui não está nada bom", McIntyre disse, conforme se recorda.
Ele não sabia disso, mas se encontrava numa fronteira crítica. Acima dele, em 19 andares da torre, havia 1.344 pessoas, muitas delas vivas, em choque, mas não feridas e implorando por socorro. Nenhuma iria sobreviver.
Abaixo dele, em 90 andares, milhares de outras também estavam vivas, em choque, não estavam feridas e imploravam por ajuda. Quase todas sobreviveram.
A situação naquela escadaria estava ruim, mas, conforme McIntyre contaria mais tarde, era pior ainda nas outras duas saídas de emergência. Então ele voltou para a primeira escadaria, a noroeste do centro do edifício. Imediatamente, escorregou sobre o gesso e desceu dois andares deslizando. Ileso, pôs-se de pé e observou luzes mais abaixo. Ele se recorda de ter chamado "por aqui!". Seus colegas da ABS se juntaram ao êxodo do andar 91.
Um andar acima deles, no 92º, alguns funcionários da Carr Futures estavam fazendo exatamente o que o pessoal da ABS tinha feito: procurando uma saída. Eles não se deram conta de que estavam do lado errado dos escombros.
No 92º andar, Damian Meehan correu para encontrar um telefone livre na Carr Futures e ligou para seu irmão Eugene, bombeiro no Bronx. "Está muito ruim mesmo aqui", Meehan lhe disse. "Os elevadores quebraram."
"Vá até a porta da frente, veja se há fumaça lá", Eugene Meehan recorda de ter lhe pedido. Ele ouviu seu irmão largar o telefone, depois acompanhou os sons que lhe chegavam aos ouvidos. Havia gritos e confusão, mas não pânico.
Alguns minutos mais tarde, Damian Meehan voltou e informou que a entrada da frente estava cheia de fumaça. "Procure a escada", Eugene o aconselhou. "Veja de que lado a fumaça está vindo. Vá na direção contrária." Então ele ouviu Damian pela última vez. "Ele disse: "Nós temos de sair daqui". Ou disse: "Nós estamos saindo'", recordou Eugene Meehan. "Venho quebrando a cabeça para lembrar. Sei que ele falou "nós"."



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