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[+] entrevista
Para Arriaga, imigrar ficou mais arriscado
DO ENVIADO ESPECIAL
À CIDADE DO MÉXICO
O escritor mexicano Guillermo Arriaga é um dos roteiristas de cinema mais premiados do mundo, autor de
filmes como "21 Gramas",
"Amores Brutos" e "Três Enterros". Os dois últimos têm
a realidade mexicana como
tema, as tensões na gigantesca Cidade do México e os
dramas da vida na fronteira
entre seu país e os EUA. Leia
sua entrevista à Folha.
(RAUL JUSTE LORES)
FOLHA - A nova lei imigratória
dos EUA e a construção do muro
vão dificultar a imigração?
GUILLERMO ARRIAGA - Já dificultaram. Um coiote [quem
ajuda a fazer a travessia] cobrava US$ 1.000, agora cobra
US$ 3.000. Como a maioria
dos camponeses não tem esse dinheiro, eles já chegam
endividados por um bom
tempo para pagar seus primeiros salários às máfias instaladas do lado de lá. Se a polícia os pega, perdem tudo.
FOLHA - A imigração não vai ser
detida?
ARRIAGA - Não. A maior tragédia mexicana é a pobreza.
Continuaremos a expulsar
nossos pobres. Só vai aumentar o risco de morte dessas
pessoas. Ficou mais arriscado e caro. É uma relação hipócrita porque eles precisam
desses trabalhadores, que revitalizam o país deles. Só que
nós temos a culpa. Não deve
ser fácil para os americanos.
Nenhum país reagiria bem
com a invasão de milhões de
pessoas que não falam a sua
língua. O neoliberalismo no
México deixou os camponeses à deriva.
FOLHA - Ou seja, o maior problema está dentro de casa.
ARRIAGA - Com certeza. O
terceiro homem mais rico do
mundo é mexicano. Temos
vários na lista de bilionários.
Houve uma enorme concentração de renda nos últimos
anos. Uma história que os
brasileiros conhecem bem.
FOLHA - Era melhor nos tempos
do PRI?
ARRIAGA - Havia muita corrupção, mas os mais pobres
contavam com uma rede de
proteção, de mercados que
vendiam alimentos mais baratos a clínicas populares. A
Revolução Mexicana teve
um grande componente de
justiça social. Isso acabou.
FOLHA - O sr. tem uma visão negativa do Nafta?
ARRIAGA - Há setores que se
beneficiaram, muitas mulheres conseguiram empregos
nas maquiladoras, a indústria manufatureira cresceu
muito. Houve trapaças dos
americanos na agricultura.
Mas o pior foi o fim das políticas sociais, decidido aqui,
não pelo Nafta.
Competitividade para os
"Chicago boys" quer dizer tirar direitos e reduzir salários
dos trabalhadores. Não conheço políticos ou economistas que tenham a solução
para isso. A desigualdade
cresce em todo o mundo, da
China ao Brasil, dos EUA à
Europa.
FOLHA - O sr. fez pesquisas para
escrever "Três Enterros"?
ARRIAGA - Não precisei. Desde os 12 anos, vou ao norte.
Amo o deserto, tenho vários
amigos camponeses. O verdadeiro Melquiades teve de
imigrar, abandonar seu clima de 30C para ordenhar
vacas no gelado Wisconsin.
Nao sabe falar inglês, mas
pôde ficar conversando com
outros agricultores americanos por horas.
FOLHA - Ha vários mexicanos
hoje em Hollywood, atores, cineastas e roteiristas, como o sr. A
imagem dos mexicanos pode
melhorar nos filmes americanos?
ARRIAGA - Continuará péssima. Americanos não tem ferramentas para entender mexicanos. Eu escolhi o elenco
mexicano do "Melquiades"
["Três Enterros"]. Há muitos
preconceitos. Em "Traffic",
os mexicanos são os grandes
traficantes. Só que eles deixam as drogas em Laredo.
Quem as leva para Nova York
ou Chicago, quando o preço
cresce sete vezes? Assim como cabe a nós resolver nossa
pobreza para evitar a imigração, eles deveriam lutar contra o consumo. Os Melquiades Estradas preferiam viver
no México, com suas famílias.
(RAUL JUSTE LORES)
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