São Paulo, segunda-feira, 02 de setembro de 2002

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Aumentam as divergências no Partido Republicano

RUPERT CORNWELL
DA "REUTERS", EM WASHINGTON

As declarações belicosas em Washington sobre uma operação destinada a derrubar Saddam Hussein mascara um debate intenso dentro do Partido Republicano, ao qual pertence o presidente George W. Bush.
O desfecho da discussão não determinará apenas o destino do ditador iraquiano mas também o sistema de relações internacionais em vigor.
A discussão se resume na seguinte encruzilhada: os EUA podem intervir unilateralmente ou precisam inicialmente ganhar o apoio de aliados com as bênçãos das Nações Unidas?
Que Saddam deva ser derrubado é algo com o que todos concordam. A pergunta, no entanto, é como fazê-lo, algo que faz a administração Bush se mostrar contraditória e atrapalhada.
O problema coloca de um lado os "falcões" liderados pelo vice-presidente Dick Cheney e pelo secretário da Defesa Donald Rumsfeld, e de outro o grupo mais moderado, representado pelo secretário de Estado Colin Powell e composto por militares próximos aos republicanos e mandarins da diplomacia, como James Baker e Brent Scowcroft, que eram o assessor de Segurança Nacional e o secretário de Estado quando o presidente Bush, pai de George W. Bush, lançou a guerra que forçou Saddam a desocupar o Kuait.
O grupo de Cheney e Rumsfeld fundamenta seus argumentos no sacrossanto dever militar do país. Isoladamente, os EUA podem derrotar o Iraque sem dificuldades e, se deixarem claro que assim o farão, outros países não teriam escolha a não ser acompanhá-los. Ainda para o grupo, levar a questão à ONU e pressionar pela volta dos inspetores de armas é fazer o jogo protelatório de Saddam, o mestre da prevaricação.
Não se preocupem com os hesitantes, diz Rumsfeld. Eles reagiram da mesma forma em 1991, antes da Guerra do Golfo, em 1999, quando do conflito em Kosovo, ou no ano passado, precedendo as operações que derrubaram o regime afegão.
O mesmo tende a acontecer com o Iraque, desencadeando um círculo virtuoso que atingiria o mundo árabe e países de fora dele.
Os moderados do Partido Republicano concordam com as premissas básicas dos falcões. Acham que Saddam é uma ameaça para a região, que ele vem violando resoluções da ONU e que, se ele já usou no passado armas de destruição em massa, não hesitaria em obter armas nucleares como um instrumento de chantagem. Além disso, como Saddam se suicidaria ao atacar diretamente os Estados Unidos, é possível que ele disponibilize armas biológicas ou químicas a grupos terroristas como a Al Qaeda.
O que preocupa os moderados são as consequências posteriores a uma operação solitária dos Estados Unidos. Baker pensa nos danos que a imagem do país sofrerá. O general Scowcroft adverte para o antiamericanismo já existente em razão do apoio de Washington a Israel.
Os moderados acreditam, assim, que a obtenção de um mandado da ONU, ou ao menos um esforço para obtê-lo, seria a condição mínima para desencadear uma guerra. Powell pensa da mesma maneira.
Ou seja, George W. Bush é quem deve tomar solitariamente a decisão final. Há o pressentimento de que, por instinto, ele concordaria com os falcões. Ele nunca perde a oportunidade de conclamar a uma "mudança de regime", eufemismo de uma intervenção militar no Iraque.
Ele sabe que a guerra está na raiz de seus estratosféricos índices de aprovação, que estão hoje bem menores mas que são mesmo assim invejáveis para um presidente no meio do mandato.
Recuar agora, acredita Bush, afetaria sua credibilidade e daria a Saddam uma vitória moral. Mas Bush também sabe que, mesmo que bem-sucedida, uma operação contra Saddam insuflaria o sentimento antiamericano que abastece os terroristas em potencial, criando outros problemas como forçar a presença de tropas americanas em Bagdá por alguns anos.


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