São Paulo, domingo, 02 de setembro de 2007

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Combate ao ópio beneficia Taleban, defende estudo

Para diretor de ONG, solução é legalizar a droga

SÉRGIO DÁVILA
DE WASHINGTON

Se os EUA conseguirem atingir pelo menos um de seus objetivos no Afeganistão, o principal vencedor será o grupo radical islâmico proscrito Taleban, o mesmo que deu guarida para o terrorista Osama bin Laden e sua Al Qaeda prepararem o ataque de 11 de Setembro. O paradoxo é defendido em levantamento recente feito pela ONG Drug Policy Alliance.
O Afeganistão, que fornece 90% do ópio consumido no mundo, é um dos raros países da Terra em que os EUA lutam suas duas principais guerras: a "guerra contra o terror", pilar dos dois mandatos de George W. Bush, e a guerra antidrogas, herança ainda da presidência de Richard Nixon (1969-1974). Se vencerem a última, defende Ethan Nadelmann, diretor-executivo da Drug Policy, estarão fortalecendo o Taleban.
"Pense por um momento que os EUA, a Otan (aliança militar ocidental) e o governo do [presidente afegão] Hamid Karzai consigam de alguma maneira interromper a produção de ópio no Afeganistão", escreve ele na última edição da revista "Foreign Policy". "Quem iria se beneficiar? Só o Taleban, os líderes guerreiros e outros empresários do mercado negro, que veriam o valor de seus estoques disparar."
Pelo raciocínio de Nadelmann, com a proibição, os EUA indiretamente dariam dinheiro aos inimigos que tentam derrotar, hoje financiados pela venda da droga. A solução? "Legalizar já", defende. O argumento vai além do tradicional, defendido desde os anos 90 por economistas como Milton Friedman (1912-2006), segundo o qual um produto com alta demanda que é comercializado ilegalmente num país, como as drogas, causa perda em impostos para o governo em questão.
A novidade é o argumento da legalização das drogas não só por motivos econômicos, mas como linha auxiliar no combate ao terrorismo islâmico. É o mesmo que defende o escritor e polemista Christopher Hitchens, autor de "Amor, Pobreza e Guerra" (Ediouro). "Nós queimamos e destruímos o que, na verdade, é a única cultura do país, enquanto sofremos com a falta de analgésicos nos EUA", escreveu. "Por que, em vez disso, não compramos a colheita afegã e a usamos para produzir os analgésicos?"
O pais já compra ópio medicinal da Turquia, afirma Hitchens, "que não precisa do dinheiro". O dinheiro obtido com as drogas, argumenta, poderia ser usado como incentivo para que o país voltasse a produzir uvas viníferas, o que fazia três décadas atrás.
"O lucro que hoje em dia vai para traficantes e terroristas poderia ser aplicado diretamente na reconstrução do Afeganistão, ao mesmo tempo em que enfraqueceria aqueles que se beneficiam de um monopólio criado artificialmente."

"De Pablo a Osama"
A relação entre drogas e terrorismo islâmico aparece em outro livro recém-lançado, "From Pablo to Osama - Trafficking and Terrorist Networks, Government Bureaucracies and Competitive Adaptation" (De Pablo a Osama - tráfico e redes terroristas, burocracias governamentais e adaptação competitiva, Pennsylvania State University Press), de Michael Kenney.
Nele, o professor de políticas públicas usa as semelhanças entre o traficante colombiano Pablo Escobar (1949-1993) e o terrorista saudita Osama bin Laden como partida para chegar ao principal ponto em comum entre as duas atividades, tráfico de drogas e terrorismo: a incrível resistência à repressão organizada. Conseguem isso, argumenta o autor, por se adaptar rapidamente a novas realidades, enquanto os governos em geral se perdem na lentidão da burocracia.


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