São Paulo, sexta-feira, 02 de setembro de 2011

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice | Comunicar Erros

MOISÉS NAÍM

O verão de Gaddafi, Rupert e Hugo


Gaddafi perdeu a Líbia, Murdoch um de seus jornais sensacionalistas e Chávez perdeu a saúde


O que Muammar Gaddafi, Rupert Murdoch e Hugo Chávez têm em comum? O longo verão de 2011 será inesquecível para todos eles. Gaddafi perdeu a Líbia, Murdoch um de seus jornais sensacionalistas -e talvez mais-, e Chávez perdeu a saúde. Claro que nenhum deles se saiu tão mal quanto Osama bin Laden.
E enquanto o verão de 2011 foi terrível para um grupo de extremistas religiosos, para outro foi muito bom: a Al Qaeda sofreu perdas importantes (além de Bin Laden) e o Tea Party conquistou grandes êxitos. Este último conseguiu impor sua radical agenda antigoverno ao Congresso dos Estados Unidos.
Os deputados do Tea Party deixaram a superpotência de joelhos ao ameaçar que, caso suas condições não fossem aceitas, forçariam uma suspensão de pagamentos pelo governo, o que naturalmente causaria caos financeiro mundial. Resta ver se o grupo Tea Party conseguirá prolongar o seu verão de sucessos.
As pesquisas indicam que, como a Al Qaeda, sua agenda não é compartilhada pela maioria das pessoas que afirma representar. Nesse sentido, o furacão Irene também deixou uma esteira política: se bem tenha sido menos violento que o esperado, o setor público, tão vilipendiado, desempenhou papel insubstituível nos preparativos para a chegada do Irene.
Nos momentos de maior ansiedade da população, a ação do governo foi firme, eficiente, visível. E quem atuou dessa maneira foram os órgãos governamentais -federais, estaduais e municipais- cujos orçamentos o Tea Party deseja minimizar ou eliminar.
Será interessante ver se essa contradição influenciará o debate político norte-americano, que se intensificará a partir da semana que vem e não perderá o ímpeto até a eleição presidencial de 2012.
Barack Obama, o mais importante protagonista desse debate, tampouco teve um bom verão. Os títulos de seu país perderam a classificação de crédito AAA, a economia passou por uma tormenta mais feroz que o Irene e a popularidade do presidente caiu ao seu ponto mais baixo até agora.
Obama, além disso, teve de interromper suas férias. E não foi o único: o primeiro-ministro britânico David Cameron se viu obrigado a regressar da Itália para enfrentar os saques em Londres e outras cidades inglesas e, por motivos muito distintos, Bashar Assad tampouco pôde sair de férias, porque estava ocupadíssimo coordenando o massacre de seu amado povo sírio.
Cada um desses eventos representa uma manifestação concreta de tendências mundiais cujas consequências afetarão a todos por muitos verões: a dificuldade de reconciliar as dinâmicas políticas próprias da democracia e as exigências de uma economia de mercado no mundo globalizado; a fome de dignidade e liberdade que se manifesta em sociedades que sofreram abusos de parte de tiranos por longo tempo; a crescente insegurança dos poderosos; ou fenômenos climáticos que, como no caso do Irene, não ocorriam há mais de um século. Além, claro, de acidentes que mudam a história. Neste verão, muitos venezuelanos começaram a meditar sobre esse tópico.

Tradução de PAULO MIGLIACCI

AMANHÃ EM MUNDO
Paul Krugman



Texto Anterior: Acusados de mercenários, negros se escondem em porto
Próximo Texto: Casa Branca corta pela metade a previsão de crescimento dos EUA
Índice | Comunicar Erros



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.