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ARTIGO
Contra um projeto autoritário
TULIO HERNÁNDEZ
ESPECIAL PARA A FOLHA
Basicamente, votarei contra
Chávez e a continuidade de seu
projeto. Apesar de ter votado
nele nas primeiras eleições que
o levaram à Presidência, de haver apoiado -embora criticamente- seus primeiros anos
de gestão e, depois disso, de ter
me mantido em posição intermediária, procurando colaborar na construção de espaços de
diálogo a partir do movimento
"Aqui Cabemos Todos", hoje
considero que o projeto bolivariano e a personalidade de Hugo Chávez constituem uma ameaça à convivência pacífica
dos venezuelanos e à realização, dentro de um contexto democrático, das transformações
profundas de que o país precisa
há muito tempo.
Depois de oito anos de governo, já sabemos com certeza que
o projeto bolivariano, embora
em seu discurso consiga expressar os interesses e aspirações de determinadas maiorias
venezuelanas, é um projeto autoritário, que violenta sistematicamente a autonomia dos Poderes fundamentais da democracia.
Ademais, é um projeto militarista, tanto pela grande participação de militares em cargos
do governo quanto pelo discurso que converte as eleições em
"batalhas", organiza os cidadãos em "batalhões", "pelotões" e "esquadras" eleitorais,
além da insistência de um presidente eleito como civil em
portar o uniforme militar. Isso
sem falar da demente corrida
armamentista e do esforço empreendido para formar milícias
de civis armados com os 100
mil fuzis Kalashnikov comprados da Rússia.
Também se trata de um projeto que destruiu qualquer possibilidade de diálogo político;
que emprega o argumento dos
efetivamente inconstitucionais
atos de um setor da oposição,
em 2002, para satanizar e criminalizar a dissidência e o protesto social; que estimula a violência sistemática dos "camisas
vermelhas" contra os cidadãos
opositores; que cultua a ilegalidade, ao estimular invasões de
terras produtivas e imóveis de
propriedade reconhecida; e,
pior de tudo, que converteu o
debate político numa verborréia vulgar e agressiva, feita de
desqualificações morais e pessoais lançadas não apenas contra venezuelanos da oposição
como também contra estadistas e líderes estrangeiros,
criando um clima emotivo negativo e de ódio de classes que
enche o país de inquietação.
Por outro lado, mais que uma
revolução, o projeto bolivariano tem sido uma continuidade
dos aspectos piores do sistema
bipartidário anterior. O primeiro destes é a proliferação
evidente da corrupção como
prática aceita sem ser combatida. O segundo é a utilização dos
imensos recursos da receita petrolífera em planos sociais de
redistribuição e assistencialistas como as Missões (antes chamadas de Operativos), que, se
bem resolvem problemas
emergenciais, gerando um sentimento de reconhecimento
nos setores populares e muita
simpatia eleitoral para com o
regime, não solucionam os graves problemas sociais do país
nem a médio nem a longo prazo, não geram institucionalidade sólida de serviços, nem estimulam a produtividade e o desenvolvimento econômico capazes de gerar empregos. Passados oito anos de gestão, o desemprego não apenas se manteve, como vem crescendo.
Por outro lado, embora meu
candidato fosse Teodoro Petkoff, um socialista que pode ser
situado nas linhas democráticas e institucionais de Lula, Tabaré Vázquez ou Bachelet, votarei em Rosales, apesar de saber que ele conserva vínculos
com parte da direção política
que representa o passado que
há tempo queremos mudar.
O farei primeiramente porque Petkoff, ao ver-se pouco favorecido nas pesquisas, se afastou em favor de Rosales, de cuja
equipe de campanha hoje faz
parte. Em seguida, porque estamos diante de um homem confiável, na medida em que possui
grande experiência política e de
governo (foi prefeito da maior
cidade do país, duas vezes governador do Estado de maior
população, vereador e deputado da Assembléia Legislativa
estadual) e que se mostra sereno e permanentemente aberto
ao diálogo, favorecendo a reconciliação entre os venezuelanos. Ademais, nestes tempos de
campanha, Rosales reafirmou
sua vocação popular e, embora
ofereça coisas populistas muito
parecidas com as de Chávez, temos a certeza de que poderemos nos afastar dele quando
quisermos, sendo que Chávez
se prepara para modificar a
Constituição e governar até
2026, fato que, por si só, já
constitui razão suficiente para
não votar nele.
TULIO HERNÁNDEZ é sociólogo venezuelano,
professor universitário e colunista do jornal "El
Nacional"
Tradução de CLARA ALLAIN
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