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Esquerda pressiona Obama a se pronunciar
Analistas dizem temer que o silêncio do presidente eleito sobre Gaza mine boa vontade entre árabes e muçulmanos
Ofensiva de Israel pode fortalecer ideia de que novo presidente deva cuidar do desafio iraniano antes da questão israelo-palestina
ANDREA MURTA
DE NOVA YORK
Quando o assunto é o abismo
econômico em que se meteu os
EUA, o presidente eleito Barack Obama não espera até a
posse, no próximo dia 20, para
apresentar estratégias de ação.
O caso da ofensiva israelense
em Gaza, porém, desperta reação diferente: sua equipe adere
ao mantra "só temos um presidente de cada vez", repetido
após a invasão de ontem, irritando a opinião pública árabe e
preocupando os que esperam
uma nova abordagem da política para o Oriente Médio.
As pressões partem principalmente de analistas da esquerda americana. Eles alertam que o silêncio atual não
ajuda Obama a construir a confiança necessária para avançar
as negociações de paz entre Israel e os palestinos.
"Negligenciar o engajamento
neste estágio crítico envia a
mensagem errada sobre a seriedade com a qual Obama perseguirá um "papel ativo" [no
conflito]", escreveu o comentarista John Nichols na revista
esquerdista "The Nation".
"Suas opções são limitadas,
assim como sua oportunidade
de fazer a diferença e sinalizar
um novo começo. Ele pode ter
apenas uma chance", afirmou o
colunista Simon Tisdall no jornal britânico "The Guardian".
Fora dos EUA, as críticas
ecoam entre palestinos e seus
simpatizantes. Na sexta, a liderança do Hamas mostrou que
tentará tirar proveito político
do silêncio de Obama. "O senhor começa mal", disse Khaled Meshaal, líder do grupo em
Damasco. "Condenou os ataques em Mumbai [Índia], mas
não diz nada enquanto centenas de palestinos são mortos.
Ocidente, estamos cansados de
ver dois pesos, duas medidas."
Enquanto isso, grupos judaico-americanos, como o Israel
Project e o Aipac (Comitê Americano de Assuntos Públicos de
Israel), se apegam à fala de
Obama na cidade israelense de
Sderot, que visitou em julho.
Na ocasião, ele afirmou que, "se
estivessem jogando foguetes na
casa em que minhas filhas dormem, eu faria tudo a meu alcance para pôr um fim a isso".
Ordem de prioridades
A escolha sobre em que assuntos se meter antes de chegar ao poder não foge à ordem
de prioridades do público americano. Em pesquisa recente do
"Washington Post" e da rede
ABC, dois terços põem a economia em primeiro lugar, enquanto a política externa teve
menos de 1% dos votos.
Em pergunta apenas sobre
política externa, a questão israelo-palestina ficou no fim de
uma lista de 12 itens de importância para os EUA.
"Politicamente, não há vantagem em abordar [o conflito]
agora", disse ao "Post" G. Calvin MacKenzie, professor de
governo do Colby College. "Não
há boas notícias aí."
Ainda que seja terreno perigoso, para o mundo muçulmano a inação de Obama cheira a
"mais do mesmo". Durante a
campanha, ele mostrou progressivo viés pró-Israel à medida que se aproximava a eleição.
Horas depois de assegurar a
candidatura democrata, em junho, Obama disse na Aipac que
Jerusalém, cujo setor oriental é
reivindicado pelos palestinos
como sua futura capital, deve
ser a "capital indivisível" de Israel. Muitos árabes consideraram o discurso um "tapa na cara", como classificou na época
um jornal do Kuait.
Obama também prometeu
"garantir que Israel possa se
defender de qualquer ameaça
-de Gaza a Teerã".
Hillary
Nesse ponto, ele contará com
uma secretária de Estado ainda
mais contundente. Hillary
Clinton, quando ainda disputava com Obama a candidatura
democrata, disse que o Irã seria
"destruído" se atacasse Israel.
Seu histórico no tema é misto. Quando primeira-dama,
Hillary apareceu ao lado da
mulher do líder palestino Iasser Arafat (1929-2004) em Ramallah, na Cisjordânia. Também defendeu o Estado palestino antes de esta ser a política
oficial da Casa Branca.
Mas os palestinos não comemoraram quando Obama indicou a substituta de Condoleezza Rice. Tampouco foi motivo
de festa a nomeação de Rahm
Emanuel -defensor de Israel-
para chefe-de-gabinete (equivalente a chefe da Casa Civil).
Obama contou no passado
com assessores menos pró-Israel, como Zbigniew Brzezinski
(que foi assessor de Segurança
Nacional de Jimmy Carter) e
Robert Malley (membro da
equipe de segurança nacional
de Bill Clinton). Mas, segundo o
site Politico, a situação em Gaza "pode fortalecer a influência
de conselheiros mais agressivos, que afirmam que o primeiro passo para a paz no Oriente
Médio deve ser isolar o Irã, e
não negociar com palestinos e
israelenses".
Obama ainda tem tempo para se engajar no problema antes
da posse. A seu favor estão uma
alta popularidade, inclusive entre muçulmanos, e a fadiga do
governo Bush. Não faltam sugestões de especialistas de esquerda. "Não é o caso de defender lançamentos de foguetes,
mas reconhecer que seu poder
limitado de matar deve ser
comparado à força de resposta
de Israel" afirmou em artigo o
jornalista Sandy Tolan.
"Ele precisa culpar Bush por
sua incrível recusa em se envolver [no começo de dezembro],
quando o Hamas indicou que
acabaria com o cessar-fogo",
disse o comentarista Richard
Dreyfuss em seu blog.
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