São Paulo, domingo, 04 de janeiro de 2009

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Pai de brasileira morta pede "arejamento"

Ativista cuja filha foi vítima de foguete em Israel elogia ideia do Brasil de incluir mais países em negociações de paz

"Farei o que puder para que outros pais, israelenses e palestinos, não tenham que enterrar seus filhos", diz o paulista Natan Galkovitz

DO ENVIADO ESPECIAL A JERUSALÉM

Tocado de forma trágica pelo conflito entre israelenses e palestinos, o paulista Natan Galkovitz mantém a esperança no diálogo, mas acha que é hora de trocar os intermediários. Desde que sua filha foi morta por um foguete perto da fronteira com Gaza, em 2005, ele busca mobilizar atenções pelo mundo para combater o fanatismo e ajudar outras vítimas do terror.
Há poucos dias, enviou uma mensagem para o ministro das Relações Exteriores Celso Amorim, elogiando a ideia brasileira de ampliar o grupo de mediadores do processo de paz. Desde 1979 em Israel, onde chegou com 27 anos, ele também se ofereceu para compartilhar sua experiência como vítima do conflito.
"Eu sei o que é perder uma filha, ir para o hospital e reconhecer um corpo no necrotério. Não desejo isso para ninguém", disse Natan à Folha. "Por isso farei o que puder para que outros pais, israelenses e palestinos, não tenham de enterrar mais seus filhos."
Sua vida mudou para sempre no dia 14 de julho de 2005, quando a filha Dana, 22, foi morta pelo impacto direto de um morteiro lançado por extremistas de Gaza. Desde então, Natan tem se dividido entre o restaurante de comida brasileira que mantém no kibutz (comunidade agroindustrial) Bror-Hail, a poucos quilômetros de Gaza, e o ativismo pelo fim da violência.
No ano passado, ajudou a arrecadar US$ 1 milhão para vítimas do terror. Além disso, dá palestras e escreve cartas para governos estrangeiros, especialmente aqueles que estão fora do círculo atual de negociação do processo de paz. Sua meta coincide com a proposta recente do presidente Lula, de "arejar" as conversas, com a inclusão de novos participantes.

Papel do Brasil
"Os Estados Unidos não servem mais como mediadores porque perderam completamente a credibilidade entre os árabes", diz Natan. "Por isso precisamos trazer mais países para a mesa de negociação, sobretudo países neutros como Brasil, Índia e México."
Para Natan, o Brasil deveria ir além e preparar um documento com propostas para avançar o processo da negociação de paz entre israelenses e palestinos. "Eu sei que o Brasil historicamente não tem influência na região", reconhece. "Mas a vantagem é que é bem-visto pelos dois lados."
O restaurante que abriu em 2006 no Bror-Hail, conhecido como o kibutz dos brasileiros, foi uma das formas que encontrou de homenagear a filha, que tinha dupla cidadania. "No restaurante eu continuo preparando tudo o que ela gostava, como feijoada e estrogonofe."
Embora creia que a ofensiva israelense era "inevitável" para responder aos mísseis do Hamas, Natan teme que a "incompetência" do governo israelense impeça que ela se transforme em segurança e leve a uma solução política.
E não tem dúvidas de que a campanha eleitoral está tendo influência sobre as decisões militares. "O governo israelense só pensa nas eleições, e isso está prejudicando os dois lados. Sem a colaboração da comunidade internacional, esse conflito não terá solução."
No kibutz Zikim, também no raio de alcance dos foguetes de Gaza, um outro brasileiro concorda com Natan. Marc Levi, 60, diz que o Hamas é uma "organização problemática", pois não reconhece o direito de existência de Israel, mas que não há solução militar para o impasse.
"Temos de usar essa operação para obter facilitar uma solução política", diz Levi, que considera inevitável uma eventual negociação com os fundamentalistas. A conversa por telefone com a Folha é interrompida pelo som de uma sirene, anunciando a iminente queda de mais um foguete. "Essa é a nossa rotina", diz Levi, em um tom resignado. (MARCELO NINIO)


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