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ARTIGO
Mudança no FBI é uma farsa
WILLIAM SAFIRE
DO "THE NEW YORK TIMES"
Sob os poderes policiais com os quais operou no ano passado, e com a cooperação legal de uma CIA mais bem administrada, um FBI dirigido com mais eficácia
poderia muito bem ter prevenido a catástrofe de 11 de setembro. Essa é uma probabilidade assustadora que uma investigação realizada pelo Congresso vai começar a mostrar, nesta semana.
Para produzir um álibi que explique sua omissão e acobertar a constrangedora redução do orçamento das operações de contraterrorismo promovida por sua
pasta no ano passado, o secretário da Justiça, John Ashcroft, jogou
por terra diretrizes fixadas havia uma geração para impedir o abuso da força policial pelo governo federal. Ele o fez em conjunto com seu assessor escolhido a dedo, o diretor do FBI, Robert "J. Edgar" Mueller [referência a J. Edgar
Hoover (1895-1972), controvertido diretor do FBI de 1924 a 1972].
Eles o fizeram por meio de decreto executivo: não houve discussão pública nem ação do Congresso ou orientação judicial. Se tivéssemos tido esses novos poderes no ano passado, diz a farsa com a qual procuram se proteger das críticas, poderíamos ter impedido a ação terrorista.
Não é verdade. Eles tinham o poder necessário para obter as informações. O que lhes faltou foi usar seu intelecto para analisar os dados colhidos pelas agências.
Vemos, assim, que novos poderes de vigilância estão sendo invocados como cortina de fumaça, visando a esconder o fato de que os poderes antigos não foram devidamente utilizados.
Ashcroft alega que está meramente autorizando a polícia federal a estar presente a eventos públicos ou a navegar pela internet, o que "até mesmo uma criança de
12 anos pode fazer". Mentira: é claro que, sob as diretrizes anteriores de combate a abusos, o FBI podia perfeitamente enviar um agente a um jogo de beisebol, a uma igreja ou a um comício.
Tudo o que precisaria seria "uma informação ou alegação que, para ser tratada de maneira responsável, exigiria investigação adicional". Para poder investigar
um crime, a polícia federal não precisava sequer de "causa provável" -bastava uma informação ou pista sobre possíveis infrações.
A mesma coisa se aplica a navegar pela internet, ler um jornal ou
assistir aos jornais na TV. Em muitos casos, é assim que os
agente do FBI em campo eram
alertados para um crime potencial, podendo, então, abrir um inquérito preliminar.
Se uma pista rendesse "indícios
razoáveis de atividade criminosa", os agentes podiam lançar
uma investigação plena sem se reportar à sede. Isso incluía a contratação de informantes, montagem de tocaia para vigiar uma casa e busca de autorização para fazer revistas e grampear telefones.
Sob o novo decreto imposto por
Ashcroft e Mueller, o necessário
indício de atividade criminosa
potencial é eliminado. Sem dispor
de um fragmento que seja de evidências de que um crime esteja
sendo cometido, os policiais federais poderão levar adiante investigações plenas pelo prazo de um
ano. O objetivo é gerar suspeitas
de conduta criminosa. É a própria
definição de "pescaria".
Os representantes do governo
dizem que não precisamos nos
preocupar -eles não pretendem
compilar dossiês sobre indivíduos, grupos de igreja ou clubes
políticos, o tipo de abuso que reprimia as vozes discordantes nos
"maus velhos tempos".
Só porque os chefes do FBI são
analfabetos em termos de informática, será que pensam que o
público desconhece a capacidade
que têm os tecnólogos de hoje de
juntar relatórios de vigilância do
governo, nomes registrados em
listas de membros e filiados e a
busca de dados conduzida por detetives particulares, de modo a
criar dossiês instantâneos sobre
americanos seguidores da lei?
Considere o novo alcance do
poder federal: a declaração de imposto de renda; as notas na faculdade; as avaliações profissionais;
as compras com cartão de crédito;
as contribuições para grupos políticos e associações beneficentes;
as compras em farmácias; os documentos de seguro; as assinaturas de jornais e revistas; cada visita a site da internet; cada comentário em cada sala de bate-papo;
cada livro ou filme comprado ou
consultado na Amazon.com
-tudo isso se soma às passagens
aéreas e aos ingressos, aos registros de prisões, a investigações
eventuais e às queixas feitas por
vizinhos irados ou amantes rejeitados que chegam ao FBI.
Todos os dados pessoais de um
cidadão estão ali mesmo, na encruzilhada do marketing moderno com a ação policial federal moderna. E tudo isso em nome da
guerra contra o terrorismo.
Não estamos falando de algum
pesadelo sobre o que pode vir a
acontecer algum dia. Já aconteceu
na semana passada.
Jim Sensenbrenner, presidente
da comissão judiciária da Câmara
dos Deputados, disse que a eliminação das restrições o deixa "incomodado"; Pat Leahy, da comissão judiciária do Senado, está
ocupado demais bloqueando a
ação de juízes para ter tempo de
fazer objeções.
Alguns libertários otimistas estão dispostos a tolerar essa perda
de liberdade pessoal na esperança
de que as normas de intromissão
decretadas por Ashcroft e Mueller
possam prevenir um atentado. Isso não vai acontecer, porque essas
normas são uma farsa.
Tradução de Clara Allain
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