São Paulo, quinta-feira, 04 de novembro de 2004

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Medo de fraude serviu para mobilizar

RAFAEL CARIELLO
DA REPORTAGEM LOCAL

O temor de que problemas na contagem de votos ou irregularidades eleitorais voltassem a ocorrer -como se deu em 2000, na Flórida- e prejudicassem a escolha do novo presidente americano acabou sendo inflado pelas próprias candidaturas democrata e republicana, no afã de mobilizar suas bases partidárias a comparecer no dia da eleição.
A avaliação é de dois especialistas em política americana: Nolan McCarty, professor da Universidade Princeton, e Vincent Hutchings, da Universidade de Michigan. Problemas mais graves, afinal, não ocorreram.
"Ambos os partidos tentaram manipular os medos sobre o sistema eleitoral. Os medos foram exagerados propositalmente", diz McCarty, que não nega a existência de problemas, mas afirma que, na prática, o sistema eleitoral funcionou melhor nestas eleições do que há quatro anos.
Segundo ele, foram feitos "tremendos investimentos em tecnologia e [melhoria de] procedimentos" desde 2000.
"Parte desse temor não era real, mas simplesmente parte da política -uma tentativa de mobilizar o seu lado, e a sugestão de que o outro partido tentaria roubar as eleições de alguma maneira", declara.
Para Vincent Hutchings, o temor também foi exagerado pelos candidatos, mas parte devia-se à memória do que ocorrera em 2000. Sua avaliação é que, neste ano, o sistema funcionou.
As complexidades e especificidades do voto em cada Estado, resultantes do sistema federativo americano, são, ele diz, em parte responsáveis pelo surgimento de problemas ocasionais -um sistema unificado e simples limitaria a possibilidade de confusões.
A explicação para a ênfase na possibilidade de irregularidades -visando o comparecimento das bases- deve-se ao sistema eleitoral americano, em que o voto não é obrigatório e o sistema federativo interpõe um colégio eleitoral entre os cidadãos e a escolha do presidente. A garantia de que os seus eleitores "tradicionais" apareçam para votar é tão importante quanto a conquista de indecisos.
Tanto Hutchings quanto o cientista político João Feres Júnior, do Iuperj (Instituto Universitário de Pesquisas do Rio de Janeiro), afirmam que a democracia americana é "temperada" pelo federalismo. "O sistema americano foi designado para limitar a influência dos eleitores", diz o americano.
Quem vota, efetivamente, são os representantes de cada Estado no Colégio Eleitoral. Havia, à época da Constituição do país, preocupação com "as paixões da maioria", diz Hutchings, e que essas pudessem se converter numa "ditadura da maioria", diz Feres, o que poderia afetar as minorias.


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