São Paulo, quarta-feira, 04 de dezembro de 2002

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Annan teme precipitação dos EUA

FRANÇOIS BONNET
ALAIN FRACHON
DO "LE MONDE"

O secretário-geral da ONU, Kofi Annan, acredita que os EUA possam utilizar incidentes considerados desimportantes por outros países para declarar guerra ao Iraque. "Se os EUA o fizerem, vão rachar o Conselho de Segurança", afirmou Annan em entrevista.

Pergunta - Os inspetores estão trabalhando no Iraque. O sr. acha que, com isso, a perspectiva de guerra tenha ficado um pouco mais distante?
Kofi Annan -
Acredito que a guerra seja evitável. Ela será evitável se o presidente Saddam Hussein honrar os compromissos que assumiu diante da ONU e cooperar plenamente com os inspetores. Para a comunidade internacional e o Conselho de Segurança, a questão é o desarmamento.
Se o Iraque cooperar, os argumentos em favor da guerra vão diminuir consideravelmente. Mas bastará Saddam Hussein desafiar os inspetores para que a ONU e o Conselho de Segurança cobrem dele suas responsabilidades.

Pergunta - Washington já preveniu que, se o Iraque afirmar que não possui armas de destruição em massa na declaração de seus armamentos que terá de ser feita até o dia 8, isso será considerado uma "violação aberta".
Annan -
Caberá ao Conselho de Segurança decidir. Se essa é realmente a posição dos EUA, ela deverá ser analisada com os outros membros do conselho.

Pergunta - O sr. pediu paciência ao presidente dos EUA, George W. Bush. Quanto tempo? Algumas semanas, alguns meses, um ano?
Annan -
Falei em paciência não apenas em termos de tempo, mas, sobretudo, em termos de ações, de iniciativas. Constato que há risco de que acontecimentos considerados menos importantes por outros países sejam usados para declarar uma guerra. Se os EUA o fizerem, vão rachar o Conselho de Segurança. Mas, se deixarmos aos inspetores tempo e espaço suficientes para que façam seu trabalho, a situação será outra. Teremos algo de substancial a partir do qual tomar uma decisão.

Pergunta - Segundo a resolução 1441, o Conselho pode "considerar" a situação, mas não decidir sobre uma ação militar.
Annan -
Sim, pode-se considerar que os EUA tenham as mãos livres. O Congresso americano já conferiu ao Executivo o poder de agir como achar melhor. Mas não está excluída a possibilidade de haver uma segunda resolução. Vai depender da situação.

Pergunta - Num plano mais geral, o sr. não tem dúvida de que apenas o Conselho de Segurança é habilitado a autorizar o uso da força?
Annan -
É a interpretação que faço da Carta da ONU, e acredito que isso atenda ao interesse dos Estados. Em matéria de segurança internacional, quem deve decidir, senão o Conselho de Segurança? Afinal, estaríamos falando de uma intervenção para proteger o mundo contra armas de destruição em massa.

Pergunta - Bagdá enviou ao sr. uma carta para explicar que a resolução 1441 será utilizada pelos EUA como pretexto para uma guerra. O que o sr. respondeu?
Annan -
É uma carta longa, de 15 páginas. Eles formulam algumas perguntas jurídicas, mas não acredito que isso os impeça de cooperar com os inspetores.

Pergunta - O que vai acontecer se essa missão dos inspetores durar um ano, um ano e meio ou mais?
Annan -
Os inspetores indicaram que, se houver cooperação plena dos iraquianos, o trabalho poderá ser concluído em um ano.

Pergunta - A ONU saiu dessa resolução fortalecida?
Annan -
Sim, acho que a ONU soube administrar bem esse caso, se bem que ele ainda não está encerrado. O interessante é que não foram apenas os políticos e os diplomatas que pediram que a questão fosse submetida ao Conselho de Segurança, mas também a opinião pública e, em especial, a população americana.


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