São Paulo, domingo, 05 de março de 2000


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COMENTÁRIO
Ex-ditador perdeu espaço na direita

JOÃO BATISTA NATALI
da Reportagem Local

Augusto Pinochet Ugarte voltou ao Chile como um homem politicamente enfraquecido e sem fôlego para recuperar seu antigo prestígio dentro da direita.
O impacto positivo da candidatura presidencial de Joaquín Lavín Infante foi devastador para a influência de Pinochet nos partidos direitistas RN (Renovação Nacional) e UDI (União Democrática Independente).
Lavín, ao perder o segundo turno, mas com expressivos 48,69% dos votos, demonstrou em janeiro o quanto era anacrônica a linguagem de confronto permanente com a esquerda e noções como autoridade, salvação nacional e segurança interna.
Ele igualmente teve o mérito de agregar de vez o liberalismo político ao liberalismo econômico, já defendido durante a ditadura.
Há ainda o declínio do establishment pinochetista. Os homens próximos do ex-ditador só aceitaram Lavín nos últimos meses de campanha porque ele era a alternativa para barrar o acesso de Ricardo Lagos ao poder.
Antes de ser detido em Londres, em 16 de outubro de 1998, Pinochet desencadeou um malogrado plano para arrebentar com a "Concertación", a coalizão governante da qual o hoje presidente eleito se origina.
O plano consistia em desovar todo o apoio, nas eleições primárias desse conjunto de partidos, no presidente do Senado, o democrata cristão Andrés Zaldívar. Procurava-se, assim, isolar o Partido Socialista, ao qual Lagos é filiado. Mas Lagos derrotou Zaldívar nas primárias da coalizão.
Paralelamente, a candidatura Lavín passou a crescer nas pesquisas a partir de julho do ano passado, atropelando Sebastián Piñera, da RN, que representava a segunda alternativa de Pinochet. Piñera só se lançaria com mais de 10% das intenções de voto.
Ao cair em Londres na arapuca que a Justiça espanhola lhe havia armado, o ex-ditador canalizou suas energias para sair dela. Deixou de conspirar contra Lavín.
Com Pinochet ausente do Chile, os pinochetistas enfrentaram um último insucesso: alguns deles apostaram na candidatura de Arturo Frei Bolivar -um dissidente da direita do Partido Democrata Cristão que obteve no primeiro turno menos de 0,4% dos votos.
Essa sucessão de movimentos desastrosos foi acompanhada por Lavín e seus estrategistas. Que a comemoraram ao mesmo tempo em que se tornavam uma nova referência política, contra a qual, em seu retorno, Pinochet não teria mais condições de lutar.
Desse modo, mesmo que o ex-ditador volte à política, despachando de seu gabinete no Senado, ele será um personagem efetivamente menor. Investido apenas da simbologia negativa que o eleitorado de Lagos e parte do eleitorado de Lavín atribuem ao regime autoritário que chefiou.


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