São Paulo, quarta-feira, 05 de março de 2008

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Retaliações de Chávez paralisam fluxo econômico na fronteira

Até ontem, ordem do venezuelano para militarizar região fronteiriça não havia sido cumprida, mas caminhões colombianos tiveram entrada vetada

FABIANO MAISONNAVE
ENVIADO ESPECIAL A SAN ANTONIO DEL TÁCHIRA (VENEZUELA)

Não havia caças russos Sukhoy cruzando o ar nem tanques de guerra e muito menos soldados cavando trincheiras. Mas uma série de retaliações econômicas adotadas pela Venezuela praticamente paralisou ontem a tradicionalmente congestionada fronteira com a Colômbia na região de San Antonio e Cúcuta, em meio a temores de que o governo Hugo Chávez proibirá totalmente o trânsito entre os dois países.
Nos últimos dois dias, o governo venezuelano tem adotado uma espécie de tática de guerrilha na fronteira. Na principal medida, em vigor desde anteontem, o Seniat (equivalente venezuelano da Receita Federal) vetou a entrada de caminhões colombianos no país-só em San Antonio, a passagem mais movimentada entre os dois países, o fluxo diário é de cerca de 200 veículos.
Veículos de passeio e motos não estão proibidos, mas ontem a fronteira do lado venezuelano foi fechada completamente em duas ocasiões, por cerca de 30 minutos cada uma. Já os pedestres puderam circular livremente.
Durante parte da manhã, os soldados da Guarda Nacional venezuelana proibiram o ingresso de carros e motos com placas "amarillas" (colombianos), obrigados a dar meia-volta na saída da ponte Simón Bolívar sobre o imundo rio Táchira, na verdade um riacho por onde contrabandistas cruzavam tranqüilamente para a Colômbia carregando pneus em garupas de bicicletas.
Enquanto os motoristas e motoqueiros esperavam a reabertura da fronteira, por volta das 12h30, dois funcionários do Ministério da Energia lacravam as bombas do posto de combustível internacional, o único de San Antonio onde veículos colombianos têm direito de comprar a baratíssima gasolina do país vizinho a um preço apenas 71% maior - R$ 0,12, contra os R$ 0,07 cobrados dos venezuelanos.

Às moscas
A movimentação militar ainda não é sentida na fronteira, mas, durante o dia de ontem, agências de notícias e a imprensa local relataram a saída de soldados e material bélico de cidades como Valencia e Maracay. No domingo, Chávez ordenou o envio de dez batalhões, o equivalente a cerca de 10 mil homens, à região.
No lado colombiano, o comércio, que atualmente vive dos venezuelanos em busca de produtos em falta do outro lado da fronteira, como leite e papel higiênico, estava praticamente parado. "Aqui não tem vida própria. Se os venezuelanos não vêm, temos de fechar as portas", diz Jacinto Peña, 66, dono de um mercado a poucos metros da ponte. Ele costuma vender 50 caixas de leite em pó por dia, mas na segunda-feira só saíram duas. "Isso aqui era uma procissão para lá e para cá e agora estamos sós", completa a mulher de Peña, Olinda.
"Quando presidente Uribe briga com a Venezuela, prejudica a nós", diz o mototaxista Gustavo Arguello, 37, que sobrevive transportando pessoas que querem escapar do congestionamento na ponte -a travessia em dias normais costuma durar uma hora, mas ontem não havia fila. Em vez das cerca de 20 corridas que costuma fazer numa manhã, ontem ele só havia conseguido uma até o meio-dia. Ganhou R$ 1,80 em quatro horas.
Em San Antonio, as lojas também estavam vazias por falta de colombianos, normalmente atraídos pelo câmbio paralelo favorável -a diferença com o oficial chega a cerca de 150%. Dono de uma pequena papelaria, Jaime Antonio, 43, diz que o movimento caiu 50% nos últimos dias por conta da crise. Crítico de Chávez, acha que o ataque colombiano em território equatoriano "não é um problema da Venezuela" e diz que a maioria da população não apóia o presidente no confronto com a Colômbia.
"Se houver um grito de guerra, Chávez ficará sozinho", prevê, na loja vazia.


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