São Paulo, terça-feira, 05 de maio de 2009

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Presidente do Irã cancela visita ao Brasil

Itamaraty nega que protestos contra Ahmadinejad, que nega Holocausto e prega destruição de Israel, tenham levado a desistência

Segundo iranianos, novos desdobramentos na corrida para as eleições de junho impossibilitam mandatário de deixar Irã neste momento

SAMY ADGHIRNI
ENVIADO ESPECIAL A BRASÍLIA

Em meio a informações desencontradas divulgadas ao longo do dia, o governo iraniano cancelou ontem a visita que o presidente Mahmoud Ahmadinejad faria nesta semana à América do Sul começando por Brasília, amanhã.
Não foi dada nenhuma explicação à decisão que Brasil e Irã chamam de "adiamento" para uma data posterior à eleição presidencial iraniana, em 12 de junho, na qual o linha-dura Ahmadinejad tentará se manter no cargo.
O anúncio foi feito no fim da tarde pelo Itamaraty, encerrando uma cacofonia iniciada na madrugada, quando o embaixador iraniano em Brasília, Mohsen Shaterzadeh, recebeu telefonema de Teerã comunicando o cancelamento da visita.
O diplomata em seguida convocou funcionários da representação para passar a notícia, que já estava estampada no site da agência oficial de notícias iraniana Irna.
Mas, num caso raro de descompasso entre mídia oficial e órgãos de governo, a Embaixada do Irã em Brasília contrariou a Irna e informou a vários veículos de imprensa que a visita estava mantida.
"Continua o que estava inicialmente previsto, e seguimos com os preparativos da visita", disse um porta-voz da representação. O Itamaraty afirma só ter sido informado do cancelamento às 16h de ontem, quando o embaixador Shaterzadeh foi pessoalmente ao ministério comunicar mensagem oral de Ahmadinejad.
No texto lido ontem a jornalistas pelo embaixador Roberto Jaguaribe, subsecretário-geral de Assuntos Políticos do Ministério das Relações Exteriores, o iraniano chama o presidente Luiz Inácio Lula da Silva de "amigo" e pede que o brasileiro "aceite o adiamento da visita (...) para depois da eleição".
Jaguaribe disse que o embaixador ficou insatisfeito com a "cobertura negativa feita pela imprensa brasileira", mas negou que a decisão de Teerã tivesse sido tomada em função da onda de protestos em São Paulo, Rio e Brasília contra a visita de Ahmadinejad, que questiona o Holocausto e defende varrer Israel do mapa.
O rabino Henry Sobel, que participou dos protestos contra a visita, disse ontem à Folha que "a comunidade judaica do Brasil ficou muito satisfeita com o cancelamento da viagem, porque Ahmadinejad insultou todos os judeus negando o Holocausto, promovendo a prevalência do preconceito sobre a verdade histórica".

Questões internas
A razão para a mudança de planos de Ahmadinejad está no cenário doméstico, segundo disse à Folha um alto funcionário do gabinete iraniano que estava em Brasília ultimando os preparativos.
Segundo ele, Ahmadinejad enfrenta um cenário político interno cada vez mais complicado a cinco semanas da eleição e não pode se dar ao luxo de fazer uma viagem tão longa devido aos últimos desdobramentos da campanha.
O cancelamento da visita coincidiu com dois fatos internos que abalam a candidatura de Ahmadinejad à reeleição.
Até então único candidato conservador, o presidente agora tem um rival nas fileiras radicais: Mohsen Rezei, chefe da poderosa Guarda Revolucionária entre 1981 e 1997. Em suas primeiras declarações como candidato, o radical Rezei acusou anteontem Ahmadinejad de ter implementado uma política econômica que está levando o Irã "ao precipício".
Outro motivo de preocupação para o presidente é um atrito com o homem mais poderoso do Irã, o líder supremo religioso Ali Khamenei, que até então vinha sinalizando apoio à candidatura de Ahmadinejad.
Ontem, o aiatolá repreendeu publicamente o presidente pela decisão de demitir Mostafa Khaksar Qahroudi, chefe da organização da peregrinação a Meca, órgão chamado de Hajj. A organização do Hajj está sob comando de Khamenei, que reverteu imediatamente a demissão de Qahroudi.


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