São Paulo, domingo, 05 de junho de 2005

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PROTESTOS

Na Argentina, grupos de pressão popular favoráveis ao presidente se aproximam do poder

Kirchner coloca piqueteiros no governo

MAELI PRADO
DE BUENOS AIRES

A máquina do protesto nunca esteve tão perto do poder na Argentina. Em meio a uma crise institucional na Bolívia, a Argentina, como o Brasil, enviou na semana retrasada um emissário ao país para se inteirar da situação. Diferentemente do Brasil, entretanto, que mandou o assessor internacional da Presidência, Marco Aurélio Garcia, o governo Kirchner preferiu nomear o líder piqueteiro Isaak Rudnik, funcionário da Chancelaria do país vizinho.
Além de uma escolha no mínimo pouco ortodoxa, foi um sintoma significativo da proximidade de uma parcela dos piqueteiros -grupos de desocupados que se organizaram para exigir programas sociais e emprego- do presidente Néstor Kirchner.
Não é o único. Além de Rudnik, que é um dos chefes do grupo piqueteiro Bairros de Pé e que recebe um salário de 1.200 pesos para ser assessor no Ministério de Relações Exteriores, um outro dirigente piqueteiro do mesmo grupo, Jorge Ceballos, tem um cargo no Ministério do Desenvolvimento Social argentino.
Mais: durante a gestão Kirchner, apontam especialistas que estudam o fenômeno dos piquetes na Argentina, comprovou-se que os grupos de desempregados favoráveis ao presidente receberam mais incentivos, via programas sociais e ajuda alimentar, do que os piqueteiros de oposição.
Os protestos, durante o período, diminuíram, em parte pelo acercamento com o governo de alguns grupos e em parte por uma verdadeira "cruzada antipiqueteira" realizada pela mídia argentina, que condenou a atuação de alguns grupos.
"Depois que Kirchner assumiu, várias coisas mudaram. Seus primeiros gestos políticos, assim como a sua retórica "progressista", concederam-lhe uma margem de ação mais ampla em relação a governos anteriores", analisou a socióloga Maristella Svampa, autora do livro "Entre la ruta y el barrio: la experiencia de las organizaciones piqueteras".
Já a partir de 1996, aponta, o governo argentino passou a negociar com as organizações piqueteiras, via distribuição de benefícios de programas sociais. "Ainda que em termos gerais a política de Kirchner seja de continuar a linha assistencial de seus predecessores, com todas as conseqüências negativas que isso tem em termos de clientelismo, agregou a entrega de subsídios para projetos produtivos, como a ampliação de panificadoras comunitárias", ressalva a socióloga.

"Duros" e "brandos"
Os principais grupos piqueteiros que apóiam Kirchner são a Federação de Terras e Vivendas, cujo líder, Luis D'Elía, se autodenomina um "soldado a serviço do presidente", e a Bairros de Pé, de Rudnik e Ceballos. Os piqueteiros comandados por D'Elía foram os principais beneficiados com a criação de cooperativas de trabalho para a construção de redes de água em La Matanza, na Província de Buenos Aires. Esses grupos, chamados "brandos", têm trânsito fácil na Casa Rosada.
O jornal argentino "La Nación" publicou recentemente a informação de que foi criado um grupo de diálogo entre o governo e os piqueteiros que costuma ser chamado de "O Incrível Exército de Brancaleone". Esse grupo seria liderado pelo secretário-geral da Presidência, Oscar Parrilli.
Quando o presidente argentino convocou a população a boicotar a Shell pela alta nos preços do combustível, grupos piqueteiros que apóiam o governo bloquearam vários postos da multinacional. Segundo os jornais locais, foram coordenados pelo governo.
Um dos principais grupos piqueteiros chamados "duros" (de oposição) é o Pólo Trabalhador, liderado por Néstor Pitrola.


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