São Paulo, sábado, 06 de maio de 2006

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REINO UNIDO

Derrota do Partido Trabalhista nas eleições municipais provoca megatroca de postos e aumenta pressão sobre premiê

Blair reforma gabinete após revés eleitoral

FÁBIO VICTOR
DE LONDRES

Num dos mais duros golpes sofridos em nove anos de governo, o primeiro-ministro britânico, Tony Blair, foi obrigado a fazer uma reforma ministerial que mexeu com postos-chave de seu gabinete. A medida foi tomada após a retumbante derrota do Partido Trabalhista nas eleições municipais de anteontem e deve aumentar a pressão pela abreviação do terceiro mandato de Blair.
Acossado pelo caso dos criminosos estrangeiros libertados quando deveriam ter sido deportados, o ministro do Interior, Charles Clarke, deixou o governo. Será substituído por John Reid, que era titular da Defesa, pasta que ficará a cargo do secretário do Tesouro, Des Browne.
O ministro das Relações Exteriores, Jack Straw, foi rebaixado, passando a líder dos trabalhistas na Câmara dos Comuns (a câmara baixa do Parlamento inglês). A política externa do Reino Unido passará às mãos da até aqui ministra de ambiente e assuntos rurais, Margaret Beckett, que será a primeira mulher a assumir o FCO (Foreign & Commonwealth Office) na história do país.
Empanado por acusações de uma amante, o vice-premiê, John Prescott, se manteve no cargo, mas perdeu sua atribuição mais importante, de cuidar de comunidades e governos locais. A função será assumida por Ruth Kelly, que deixa o ministério da Educação, a ser liderado pelo ministro do Comércio, Alan Johnson.
A reforma, a mais ampla da era Blair, foi anunciada pouco após a apuração dos votos das eleições locais da última quinta. Os trabalhistas perderam 319 conselheiros municipais (equivalentes a vereadores) e o controle de 18 autoridades locais na Inglaterra, além de terem terminado em terceiro, atrás dos liberais democratas.
Em sua primeira disputa eleitoral sob a liderança de David Cameron, o Partido Conservador venceu com folga a corrida, fazendo 316 novos conselheiros e controlando 11 autoridades locais a mais, seu melhor desempenho desde 1992. Segundo projeções da BBC com base nos principais colégios, em termos proporcionais os "tories" levaram 40% dos votos, os liberais democratas 27% e os trabalhistas 26%.
O ultradireitista e xenófobo Partido Britânico Nacional pelo menos dobrou o seu número de conselheiros (foi a 46), embora não tenha conseguido controlar nenhum conselho regional.

Termômetro
Nas eleições locais de 2004, os governistas sofreram derrota semelhante, então atribuída à rejeição pública à Guerra do Iraque, na qual os britânicos são aliados de primeira hora dos EUA.
Sem grande relevância política em si, as eleições locais são, porém, um eficiente termômetro das tendências do eleitorado e, desta vez como nunca antes, simbolizaram a clara rejeição dos ingleses ao governo Blair (Escócia, País de Gales e Irlanda do Norte não realizaram pleitos).
As próximas eleições nacionais estão previstas para 2009, mas é esperado que Blair entregue o cargo para o ministro das Finanças, Gordon Brown, bem antes disso. O fracasso consumado ontem é um estímulo à oposição -e mesmo aos trabalhistas descontentes- a forçar a antecipação da saída de Blair. Ao mesmo tempo, a reforma sinaliza o desejo claro de Blair de não entregar o cargo num momento de fraqueza, para não turvar o que ele chama de "legado de nove anos".
O resultado das "locais" foi o estopim da sucessão de crises que assolou o gabinete nos últimos dias. A mais grave foi a que atingiu Clarke no ministério do Interior. Na semana passada, ele admitiu que o governo libertou mais de 1.000 criminosos estrangeiros que deveriam ter sido deportados. Entre os condenados havia assassinos e estupradores.
A pressão sobre ele cresceu quando foi revelado que, sem o monitoramento da polícia, que perdeu o rastro de centenas de libertados, muitos deles reincidiram em crimes.
Já a cabeça de Prescott, o vice-premiê, ficou a prêmio com a revelação de que ele, que é casado, teve recentemente um caso de dois anos com sua secretária. Em entrevista paga a um tablóide, a ex-amante o acusou de usar instalações e veículos oficiais para encontros amorosos e de interromper ou cancelar reuniões de trabalho para namorar.
O governo também é bombardeado por sindicatos de funcionários da saúde, por seu programa de cortes de pessoal no serviço nacional do setor. A ministra Patricia Hewitt, outra cuja demissão era aventada, saiu ilesa.
Antes da tormenta iniciada na semana passada, o Partido Trabalhista enfrentara denúncias de um esquema de troca de indicações para a Câmara dos Lordes (a câmara alta do Parlamento) por empréstimos eleitorais, que se seguiram a uma devassa nos financiamentos de campanhas dos principais partidos do país -hoje investigados pela polícia.


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