São Paulo, sábado, 07 de fevereiro de 2009

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Paquistão libera cientista que vendeu tecnologia nuclear

Tribunal decide que Abdul Qadeer Khan pode circular livremente pelo país

Cientista confessou ter negociado com Irã, Líbia e Coreia do Norte; EUA pedem garantias de que ele não voltará a atividades ilícitas

SALMAN MASOOD
DO "NEW YORK TIMES", EM ISLAMABAD

Um tribunal do Paquistão decidiu ontem que o pai do programa nuclear do país, Abdul Qadeer Khan, acusado de vender tecnologia nuclear no exterior, não está mais sujeito a prisão domiciliar e tem o direito de se deslocar livremente no território paquistanês. O tribunal que suspendeu as restrições de viagem de Khan, 73, é uma nova corte com jurisdição legal limitada estabelecida pelo antigo presidente Pervez Musharraf, e ao que parece a decisão foi tanto uma jogada política do novo governo civil do país quanto um ato judicial.
Khan, que o Ocidente considera como um cientista renegado e pária que vendeu tecnologia a Coreia do Norte, Líbia e Irã, tem reputação de herói nacional no Paquistão por seu papel no desenvolvimento do país como potência nuclear. Falando a jornalistas depois que a decisão foi anunciada, o Khan disse que "tudo isso aconteceu devido ao forte interesse do presidente, do primeiro-ministro e especialmente de Rehman Malik [funcionário do Ministério do Interior] pelo caso. Eles o revisaram, e Malik estudou a situação, a discutiu com o governo e a discutiu com as autoridades envolvidas".
A suspensão das restrições serviu para pacificar o lobby conservador do Paquistão, de acordo com Talat Masood, general reformado do Exército. "Isso tirou a pressão que existia sobre o governo e gerou boa vontade para o governo devido a essa popularidade." Masood disse acreditar que o governo impedirá que Khan saia do país. "O governo se esforçará ao máximo para assegurar à comunidade internacional que ele dedicará a maior parte de seu tempo à educação e não a assuntos nucleares. Isso é muito importante para a credibilidade do Paquistão", disse.
"A libertação de Khan é uma boa decisão simbólica, que deve restaurar a fé no esforço do governo civil para sustentar sua soberania", disse Rafia Zakaria, colunista do jornal paquistanês "Daily Times". "Isso é essencial se queremos que os paquistaneses acreditem que a guerra contra o terrorismo não está sendo travada apenas em benefício dos EUA, e sim que pode servir aos seus interesses".
O Departamento de Estado americano qualificou ontem de "deplorável" a decisão da Justiça paquistanesa. A Casa Branca disse que pedirá ao Paquistão "garantias de que o dr. Khan não esteja envolvido ou comprometido em nenhuma das atividades que levaram a sua prisão domiciliar". A mulher de Khan, Henny Khan, disse que as autoridades ainda estavam retendo o passaporte de seu marido. Ela também elogiou os líderes do governo por sua decisão. "Obviamente nada poderia ter acontecido sem a aprovação do sr. Zardari [Asif Ali Zardari, atual presidente paquistanês]."
Khan foi colocado em prisão domiciliar por prazo indefinido pelo ex-presidente Musharraf, depois de ter confessado em 2003 que dirigiu uma rede nuclear ilícita por mais de 15 anos. Em investigações mais recentes, foi descoberto que a rede de Khan negociava uma versão testada, compacta e eficiente de um projeto de bomba nuclear, que poderia reduzir significativamente o prazo necessário para produzir uma arma do tipo, para cujo lançamento seria possível utilizar diversos mísseis já existentes, entre os quais o Shahab-3 iraniano.
Em entrevistas a redes locais de TV, Khan disse que sua confissão de envolvimento em proliferação nuclear, feita em 2004, era "coisa do passado". No livro "The Nuclear Jihadist" (o jihadista nuclear), Douglas Franz e Catherine Collins escreveram que Khan fez "mais para desestabilizar o delicado equilíbrio nuclear do que qualquer pessoa na história". "Ele demonstrou de maneira convincente que as salvaguardas e a mentalidade internacionais existentes não eram mais funcionais, o que conduz à sombria conclusão de que qualquer regime e qualquer indivíduo pode adquirir uma bomba atômica."

Tradução de PAULO MIGLIACCI


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