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Política externa teria outro estilo com o democrata
MÁRCIO SENNE DE MORAES
DA REDAÇÃO
Se o democrata John Kerry conseguir derrotar o republicano
George W. Bush na eleição presidencial de novembro, a política
externa americana deverá ser menos agressiva e bem mais multilateralista, porém a transformação
não será tão radical quanto gostaria o restante do planeta, segundo
analistas consultados pela Folha.
"A mudança dependerá não só
de Kerry mas também do partido
e dos secretários que serão escolhidos para compor o governo.
Mesmo assim, se ele for eleito, sua
administração será menos agressiva no que concerne a classificar
países ou grupos de terroristas ou
de seus aliados, abrindo caminho
para o uso de força militar contra
eles, o que terá forte impacto sobre a cena internacional", analisou Charles Tilly, autor de "From
Contention to Democracy" (da
contenção à democracia).
Nunca numa eleição presidencial americana, de acordo com os
analistas, a política externa esteve
tão no centro dos debates quanto
estará desta vez. Todavia, como
salientou Diana Owen, autora de
"Media Messages in American
Presidential Elections" (mensagens da mídia em eleições presidenciais americanas), isso "não
significa que o eleitorado venha a
dar grande atenção ao tema".
"Uma coisa é o que Kerry tentará utilizar como estratégia de
campanha. Outra é a percepção
popular das necessidades e dos
interesses dos americanos. Assim,
a ausência de uma forte criação de
empregos, por exemplo, será, indubitavelmente, mais relevante
para os eleitores que guerras distantes", explicou Owen.
Embora talvez não seja determinante eleitoralmente, a política
externa será crucial num eventual
governo de Kerry. "O senador democrata terá de ser coerente com
sua retórica de campanha. Assim,
será compelido a adotar posições
mais moderadas, agindo de modo
mais multilateralista e reaproximando os EUA de seus aliados
europeus tradicionais. Isso sem
abandonar a guerra ao terror",
avaliou Davis Bobrow, do Centro
Ridgway para Estudos sobre Segurança Internacional (EUA).
"Contudo essa mudança não
poderá ser radical por razões domésticas. Desde o 11 de Setembro,
o espírito da população americana sofreu uma importante transformação, e a proteção dos interesses dos EUA e de seu território
passaram a ser vitais. Kerry será
mais seletivo, mas não abandonará a possibilidade de agir preventivamente, visto que isso poderia
ser visto como um sinal de fraqueza", acrescentou Bobrow.
Por outro lado, para Ivo Daalder, co-autor de "America Unbound: The Bush Revolution in
Foreign Policy" (América sem
amarras: a revolução de Bush na
política externa), Kerry terá de fazer retroceder a "revolução" realizada por Bush, procurando reaproximar os EUA da Europa.
"Depois do 11 de Setembro, o
presidente George W. Bush foi
responsável por uma revolução
na política externa americana,
desprezando a política de alianças
que caracterizava o país e privilegiando a idéia de que os EUA são
tão poderosos que não precisam
da ajuda de ninguém na cena global. Kerry terá de alterar esse quadro", afirmou Daalder.
Nesse contexto, para Bobrow,
Kerry também deverá dar mais
valor às instituições e aos tratados
internacionais, sendo mais sensível às necessidades dos países menos desenvolvidos do planeta.
"A proteção do ambiente ganhará mais destaque. E, mesmo
no que se refere a alguns aspectos
comerciais, como os que dizem
respeito a commodities ou a certos produtos farmacêuticos,
Kerry será menos protecionista,
preocupando-se mais com as necessidades dos países pobres."
Todavia isso não impedirá que,
se eleito, ele seja seletivamente
protecionista. "O protecionismo
de Kerry tende a ser mais sutil.
Por exemplo, ele deverá ligar concessões americanas em determinadas áreas ao respeito ao ambiente. Mas, como os democratas
são mais ligados aos sindicatos,
talvez ele tome outras medidas
protecionistas", disse Bobrow.
Mesmo assim, de acordo com
Tilly, é provável que Kerry reduza
parte de alguns subsídios federais
existentes atualmente, que afetam
outros Estados. "O substancial financiamento que recebem os
grandes fazendeiros será certamente reduzido, pois Kerry não é
tão dependente desse grupo de
eleitores quanto Bush", apontou.
Os analistas também esperam
que o democrata dê mais atenção
à América Latina, que foi relegada
a segundo plano após o 11 de Setembro. "O continente americano
vem sendo negligenciado pelos
EUA há muito tempo. Entretanto
Kerry já deu a entender que pretende buscar uma maior aproximação com os governos da região", afirmou Tilly.
A Alca (Área de Livre Comércio
das Américas), porém, deverá ficar mais distante. "O livre comércio puro é uma idéia republicana.
Kerry condicionará acordos à
proteção ambiental e ao respeito
aos trabalhadores", indicou Tilly.
Oriente Médio
Para Bobrow, a política externa
dos EUA para o Oriente Médio
não deverá mudar muito, sobretudo no que concerne a Israel e
aos palestinos. "Washington não
poderá abandonar o Iraque tão
cedo. Ademais, a solução do conflito israelo-palestino depende
muito mais dos atores políticos israelenses e palestinos que dos
americanos. Republicanos e democratas já se cansaram de fazer
propostas, contudo sua aceitação
não depende dos americanos."
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