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Londres já abortou atentados, diz especialista
JOÃO BATISTA NATALI
DA REPORTAGEM LOCAL
A Al Qaeda ou núcleos a ela aparentados já haviam planejado ataques em Londres. Há cerca de um
mês, a polícia disse ter abortado
de quatro a cinco atentados.
Se os terroristas conseguiram
agora atingir seu intento é porque
provavelmente a atenção dos serviços de inteligência estava voltada para a proteção dos governantes estrangeiros que participam,
na Escócia, da cúpula do G8.
É o que disse à Folha o ensaísta
indiano Dilip Hiro, autor de 27 livros sobre a Ásia e o Oriente Médio, entre eles "Secrets and Lies:
Operation Iraqi Freedom and After" (segredos e mentiras: operação liberdade iraquiana e conseqüências). Eis sua entrevista.
Folha - Por que agora Londres?
Dilip Hiro - Devemos ligar alguns
pontos. São eles: bombas em Bali,
outubro de 2002, com 202 mortos, sobretudo australianos; bombas em Madri, março de 2004,
com um saldo de 191 mortos. E
agora, julho de 2005, Londres. A
Austrália, a Espanha e o Reino
Unido participaram diretamente
dos esforços militares dos EUA.
Folha - Há a possibilidade de os
terroristas serem ligados à insurgência laica iraquiana?
Hiro - Em 14 de janeiro deste
ano, o Conselho Nacional de Inteligência dos EUA divulgou um estudo baseado em relatórios de especialistas e agentes americanos e
estrangeiros. Concluiu que a insurgência islâmica no Iraque estava recrutando militantes de uma
nova geração. Aproveitava, para
isso, a predisposição de uma parcela de jovens radicais. Na mesma
época o "New York Times" teve
acesso a documentos da CIA segundo os quais esses ativistas islâmicos, treinados no Iraque, estavam sendo enviados de volta a
seus respectivos países. Esses terroristas tinham grandes chances,
ainda segundo a CIA, de praticar
algum atentado espetacular ainda
em 2005. Foi o que ocorreu.
Folha - A seu ver os atentados de
Londres foram cometidos por muçulmanos britânicos ou por comandos que vieram de fora?
Hiro - Foram terroristas de fora e
de dentro, atuando em conjunto.
Os que chegam de fora precisam
ter contatos dentro do Reino Unido. Eles não podem se hospedar
em hotéis para não deixar pistas.
São hospedados por simpatizantes islâmicos. Não são propriamente células da Al Qaeda, mas
grupos que atuam segundo a lógica da organização. Os que chegam
de fora são chamados na gíria dos
serviços de inteligência de "slippers" (chinelos, pessoas escorregadias). Esses agentes deixam o
país antes da ocorrência dos atentados. Foi o que aconteceu em
agosto de 1998, quando dos ataques às embaixadas americanas
no Quênia e na Tanzânia, que mataram 140.
Folha - Como imaginar que o Reino Unido estivesse desprotegido?
Hiro - Os britânicos estão constantemente em alerta. Há questão
de quatro semanas, a polícia
anunciou ter desmontado planos
que teriam levado a Al Qaeda a
cometer de quatro a cinco atentados em Londres. Os planos foram
abortados por meio dos serviços
de inteligência.
Folha - Os terroristas, então, se
vingam por causa do Iraque?
Hiro - Com certeza. Tony Blair
enviou ao Iraque um terço das
forças britânicas disponíveis. Assim, se os terroristas quiserem
identificar quem são os "bad
guys" [os homens maus], os britânicos encabeçariam a lista. Eles
têm proporcionalmente mais soldados no Iraque do que os EUA.
Folha - Mas, se houve um aborto
de atentados anteriores...
Hiro - Desta vez, havia a conferência do G8. Os focos de atenção
da polícia e dos serviços de inteligência estavam na proteção dos
governantes estrangeiros. Esse esforço de segurança deixou desprotegido um setor da rede de vigilância em que os atentados estavam sendo planejados.
Folha - Uma parcela dos britânicos islâmicos apoiaria eventualmente essa barbaridade?
Hiro - É algo complexo. Há uma
mágoa pelo fato de a guerra ao
terrorismo ter sido pretexto para
invadir um país árabe.
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