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EUROPA
Debate superficial faz de eleição um quase plebiscito sobre o premiê, que encarna o poder como nenhum italiano desde Mussolini
Itália decide hoje se Berlusconi sai ou fica
JOÃO BATISTA NATALI
DA REPORTAGEM LOCAL
Há cinco anos, Silvio Berlusconi
abriu dez pontos de vantagem sobre os adversários de centro-esquerda com uma proposta essencialmente gerencial: levar para o
Estado sua experiência de empresário bem-sucedido e recolocar a
Itália no eixo de prosperidade.
Não funcionou. Seu insucesso
justifica em grande parte a posição desvantajosa em que o líder
da Força Itália tenta, na votação
que se estende hoje e amanhã, ser
reconduzido à chefia do governo.
Em dois dos três últimos anos, o
crescimento econômico foi próximo a zero. O desemprego é de
7,5%. A indústria perdeu competitividade. Após o euro, não era
mais possível desvalorizar a lira
para atrair o mercado europeu.
Berlusconi não é diretamente
responsável pela crise na Parmalat e na Fiat, ou pela concorrência
chinesa em países aos quais a Itália exportava com avidez. Mas ele
não pôde entregar o prometido. A
dívida pública é maior que o PIB.
O déficit fiscal supera 4%. A performance do gerente foi sofrível.
Sem resultados concretos para
exibir, Berlusconi fez uma campanha quase histriônica. Sabia que o
eleitorado italiano votaria hoje
como se fosse um plebiscito sobre
sua permanência.
A excessiva concentração da
imagem política num único personagem é inédita na história italiana do pós-Guerra. O parlamentarismo sempre "esfriou" as paixões. Os partidos eram grandes
coletivos. Os premiês tinham
mandatos efêmeros. Ninguém,
após o fascismo, havia personificado o poder com tal intensidade.
Berlusconi representa maravilhosamente seu próprio papel.
Suas emissoras de TV e o controle
que ele impôs à rede pública da
RAI amplificaram esse grau de
exposição aos italianos.
No domingo passado um texto
da agência Reuters dizia: "Encontrar o premiê Silvio Berlusconi é
amá-lo. Ele tem um raro magnetismo que atrai as pessoas e um
poderoso carisma que cativa
quem cai em sua rede". O jornalista quase se assumia enfeitiçado.
Uma característica de qualquer
governante "apaixonante" está no
irrealismo das propostas. Berlusconi, no debate com seu adversário de centro-esquerda, Romano
Prodi, na última segunda, prometeu acabar com o ICI (equivalente
ao IPTU brasileiro). O problema,
aí, seria compensar a sangria orçamentária. Resposta do premiê:
combatendo a sonegação fiscal.
Mas surge com isso um segundo problema. A sonegação é sobretudo praticada pela economia
informal. Ninguém conseguiria
"formalizar" essa parcela da produção que, segundo o Istat (serviço de censo e estatísticas) representa 16% da economia italiana.
Pois eis que Berlusconi se lança
contra o Istat, alegando que as informações sobre estagnação econômica não levam em conta o dinamismo das atividades informais. O instituto respondeu que a
economia informal entrava, sim,
nos cálculos da oscilação do PIB.
A controvérsia morreu aí, sem
prejuízo em votos para o premiê.
Os convertidos ao berlusconismo também aceitam a idéia, que o
próprio premiê reitera com freqüência, de que ele não se encaixa
nas acusações de corrupção, e que
tudo não passa de perseguição caluniosa de juízes e promotores a
serviço dos partidos de esquerda.
Um levantamento da France
Presse indica que correm contra
ele oito processos e duas investigações judiciais. Três sentenças
em primeira instância, entre 1997
e 1998, o condenaram a seis anos e
cinco meses de prisão, por corrupção, maquiagem de balanços
financeiros e caixa dois.
Não há estudo quantitativo do
efeito do imbróglio na erosão de
sua popularidade. Mas muitos
crêem ser um grande fator.
Os que não votariam em Berlusconi de maneira alguma levam
também em conta as forças políticas ao seu lado, que vão, em meio
a 15 partidos, dos xenofóbicos da
Liga Lombarda aos neofascistas
da Força Nova, da Frente Social
Nacional e da Ação Social, esta última dirigida por Alessandra
Mussolini, neta do ditador.
No campo oposto, no bloco de
centro-esquerda, há entre os 17
partidos duas forças de extrema
esquerda. Mas a coalizão, dizem
seus partidários, tem um perfil
ideológico diluído. Há os verdes,
há ex-democrata-cristãos, há o
Partido da Esquerda Democrática, que é o antigo Partido Comunista Italiano, reconvertido há 30
anos à social democracia.
Nesse bloco, no entanto, o grande trunfo está no insosso Romano
Prodi, que, confirmadas as pesquisas, seria novamente premiê. É
um economista discreto, introvertido e lacônico, um anti-Berlusconi em muitos sentidos.
Chamado de "il Professore"
-ele lecionou em Bolonha, Harvard e Stanford-, é obcecado
por Berlusconi. Ele o derrotou em
1996 e, nos cinco anos em que foi
presidente da Comissão Européia, em Bruxelas, gastava parte
de seu tempo para monitorar o
desempenho do adversário.
O problema é saber se Prodi teria condições de virar a Itália pelo
avesso. A revista "The Economist" diz que a situação econômica do país é estruturalmente grave
para terapias de curto e médio
prazo. Também prevê a dificuldade de Prodi em administrar uma
maioria estreita. E aponta a ausência em sua plataforma de reformas estruturais ambiciosas.
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