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São Paulo, domingo, 09 de novembro de 2003

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Sistema bancário é o ponto fraco da economia

DA REDAÇÃO

Nos últimos quatro anos, as sucessivas decisões de colocar bancos japoneses em observação, tomadas por agências de classificação de risco de crédito -que medem a capacidade de países e de empresas de honrar suas dívidas-, provocam pânico no mercado financeiro e evidenciam um dos mais graves problemas do Japão: o sistema bancário é o calcanhar-de-aquiles de sua economia por conta do enorme volume de créditos duvidosos que concedeu.
Os números são impressionantes. Os bancos ainda têm por volta de US$ 350 bilhões em créditos duvidosos atualmente, segundo estatísticas oficiais, após já terem posto cerca de US$ 700 bilhões (valor bem superior ao PIB -total de riquezas- do Brasil de 2002, que foi de US$ 451 bilhões) na conta de despesas com devedores duvidosos desde 1992.
Em termos práticos, isso representou um colossal calote aplicado aos bancos e repassado ao governo, que deve zelar pela saúde das instituições financeiras. Estas são o motor de qualquer economia. "O governo deve garantir aos mercados que não deixará o sistema financeiro ruir em razão dos empréstimos concedidos pelos bancos, muitas vezes em troca de favores políticos", explicou à Folha Robert Immerman, da Universidade Columbia (Nova York).
Em condições normais, bancos não assumem riscos desmesurados e, para tanto, analisam a saúde financeira de quem lhes pede empréstimo. Porém, segundo Tadashi Anno, da Universidade Sophia (Tóquio), "no clima embriagante do final dos 80, essa regra básica era ignorada no Japão".
"A ajuda que o Ministério das Finanças costumava dar ao setor bancário agravou o problema, já que permitiu o surgimento do "risco moral" de autorizar tacitamente os bancos a fazer empréstimos sem se preocupar com as consequências", analisou Anno.
"Quando a bolha explodiu, nos 90, empresas que haviam comprado ações ou imóveis acabaram com um enorme ativo depreciado. Já os bancos terminaram com créditos duvidosos nas mãos. Assim, o sistema financeiro, que dá vida à economia, ficou em crise."
Abalado pela explosão da bolha especulativa (também por conta de empréstimos dados no Sudeste Asiático), o sistema bancário só se degradou. O primeiro plano de recuperação, lançado em 1998, foi ineficaz, e a política de baixíssimas taxas de juros (ou de 0%, como a atual) agravou a situação.
Afinal, deu aos bancos japoneses a possibilidade de "carregar" os créditos duvidosos (provisões) quase gratuitamente, o que retardou o oneroso ajuste contábil de passá-los para a conta de despesas com devedores duvidosos. Assim, a estagnação econômica se instalou num clima de incerteza política, ineficácia do sistema bancário e aumento do déficit público.
Segundo o FMI, a dívida pública líquida japonesa é de 72% de seu PIB (US$ 3,55 trilhões em 2002, na paridade de poder de compra).
Para piorar o quadro, segundo Jon Mills, professor na Universidade Harvard, parte dos créditos duvidosos não pode ser cobrada, pois foi concedida a "grupos ligados à Yakuza", a máfia japonesa. Ademais, outra parcela substancial dos créditos teria de ser cobrada de empresas que já estão perto da falência e pertencem, ao menos parcialmente, aos próprios conglomerados bancários.
Analistas financeiros temem que futuras degradações das classificações de risco de crédito dos bancos os obriguem a cobrir o rombo com fundos próprios, o que poderia levá-los à falência.
O governo ainda dispõe de fundos para ajudar os bancos a enfrentar a crise. Segundo analistas, a soma supera US$ 300 bilhões. Porém o premiê Junichiro Koizumi e seu poderoso ministro das Finanças, Heizo Takenaka, parecem ser avessos a essa opção por conta do crescente déficit fiscal.
Segundo especialistas, resta saber se há vontade política para deixar as empresas deficitárias terem "morte natural". Isso só será respondido após a eleição. (MSM)


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