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EUROPA
Para moradores de Le Raincy, na Grande Paris, onde quatro carros foram queimados, o político quer "aparecer"
Prefeito manda criar "patrulha cidadã"
DO ENVIADO A PARIS
O prefeito de Le Raincy, Eric
Raoult, quis ser mais realista que
o rei e virou alvo de crítica e chacota dos moradores que governa.
Antes mesmo de o governo francês decretar oficialmente o estado
de emergência, que libera os municípios para adotarem o toque de
recolher, o que foi feito ontem,
Raoult anunciou anteontem, por
conta própria, a medida na localidade de 13 mil habitantes a nordeste de Paris.
Sustentado por uma combinação de leis em vários níveis governamentais, o decreto municipal
tem alcance limitado. Estabelece
que menores de 18 anos não podem circular nas ruas entre 22h e
6h sem a companhia de um maior
responsável por eles, sob pena de
serem detidos e levados ao comissariado da infância e juventude.
Diferentemente da determinação emitida ontem pelo presidente Jacques Chirac, que limita a 12
dias o estado de emergência, o decreto de Le Raincy tem validade
indeterminada.
No que foi definido pelo prefeito como "patrulha cidadã", já anteontem à noite a primeira blitz
partiu em busca de transgressores
da nova lei. Um carro com funcionários da prefeitura e outro da
guarda municipal circularam pela
cidade, mas voltaram à base sem
deter ninguém.
A pequena e quase pacata Le
Raincy, com prédios em estilo
neoclássico e ruas limpas e arborizadas, reagiu com surpresa à novidade. Desde o início dos distúrbios, em 27 de outubro, quatro
carros foram queimados lá, pouco em comparação com os municípios vizinhos, em especial
Clichy-sous-Bois.
"Isso é marketing do prefeito. O
poder aquisitivo aqui é alto, o desemprego é baixo, a cidade está
calma. Ele quer é aparecer", disse
à Folha o engenheiro recém-formado Kevin Legloahec, 23.
"Não tem necessidade disso
aqui. Para que prender os jovens
em casa? Você quer saber por que
ele fez essa lei? Para falarmos dele", acrescentou a conselheira
conjugal Isabelle Nicolas, 44.
"É um pouquinho de publicidade dele. Aqui não tem "cité" [conjunto habitacional], o problema é
menor. Óbvio que há um risco e,
nesse sentido, pode até funcionar
a curto prazo, mas não vai resolver nada", arrematou a garçonete
Assia Grange.
Raoult, que também é deputado
(vice-presidente da Assembléia
Nacional), defende-se com o argumento de que sua cidade fica ao
lado de Clichy-sous-Bois e Montfermeil, onde ocorreram distúrbios violentos. Diz que ônibus que
vão às duas cidades passam por
Le Raincy e que vândalos já pararam lá para queimar carros e promover quebra-quebra. "Isso não
pode se repetir. Nossa cidade
sempre foi calma, e isso foi feito
para que continue assim. É melhor prevenir que remediar", disse o chefe-de-gabinete do prefeito, Jean Michel Legrand.
Ele negou que o seu chefe tenha
tomado a medida em busca de
publicidade. "Ele já é vice-presidente da Assembléia Nacional,
não precisa dessas coisas."
Apesar da grande presença de
jornalistas de todo o mundo ontem na cidadezinha, Raoult não
estava na sede da prefeitura no
início da tarde de ontem.
Além de baixar o decreto, ele fez
uma sugestão a prefeitos de 40
municípios da região de Seine-Saint-Denis para que sigam o
exemplo de Le Raincy.
Ao menos três municípios já se
valeram do estado de emergência
para decretar toque de recolher.
Segundo a agência de notícias
Reuters, Amiens, no extremo
norte da França, aprovou um decreto idêntico ao do município da
Grande Paris. "Para não estigmatizar nenhum bairro, a lei valerá
para a cidade e todos os seus subúrbios", disse um porta-voz da
prefeitura.
Outras duas cidades, Orléans,
no centro, e Savigny-sur-Orge, ao
sul de Paris, também anunciaram
a adoção do toque de recolher a
partir da primeira hora de hoje.
A explicação para que as medidas se restrinjam a menores de
idade é o fato de que os principais
protagonistas da onda de violência são adolescentes.
(FÁBIO VICTOR)
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