São Paulo, terça-feira, 10 de fevereiro de 2009

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ARTIGO

Centro destruiu plano

PAUL KRUGMAN
DO "NEW YORK TIMES"

Como se chama quem elimina centenas de milhares de empregos, priva milhões de pessoas de nutrição e atendimento médico adequados, enfraquece escolas, mas oferece bônus de US$ 15 mil a pessoas ricas que querem trocar de casa?
Centrista orgulhoso. Pois foi exatamente isso o que fizeram os senadores que definiram o pacote de estímulo americano.
Mesmo que o plano original de Obama -cerca de US$ 800 bilhões em estímulo, sendo uma fração substancial dedicada a reduções ineficazes de impostos- tivesse sido aprovado, não seria suficiente para preencher o buraco crescente na economia dos EUA, que deve chegar a US$ 2,9 trilhões até 2012.
Mas os centristas fizeram o possível para enfraquecer e piorar o plano. Um dos melhores pontos do plano original era a ajuda aos governos estaduais, que teria dado incentivo rápido à economia e preservado serviços essenciais. Mas os centristas insistiram em tirar US$ 40 bilhões dessa verba.
Dos gastos com a construção de escolas foram cortados US$ 16 bilhões; a ajuda aos desempregados, sobretudo para manter seu atendimento médico, e o auxílio-alimentação foram cortados. Mais de US$ 80 bilhões foram cortados, a maior parte, de medidas que teriam efeito na redução da profundidade e dor desta recessão.
Por outro lado, os centristas não viram problema no crédito fiscal para imóveis residenciais proposto pelo Senado.
Tudo contabilizado, se for refletida no pacote final, a insistência dos centristas em confortar quem já vive confortável e afligir mais ainda os aflitos levará à geração de substancialmente menos empregos e provocará muito mais sofrimento.

Suprapartidarismo
Atribuo a culpa por isso à crença do presidente Barack Obama de que é capaz de transcender a divisão partidária. Afinal, muita gente esperava que ele apresentasse um plano de estímulo forte, que refletisse a má situação da economia e os anseios de seus eleitores.
Em vez disso, Obama pôs na mesa um plano pequeno e dependente de cortes de impostos, porque queria o apoio amplo dos dois partidos. Os mesmo anseios talvez expliquem porque Obama não falou com contundência sobre como os gastos do governo podem ajudar a apoiar a economia e permitiu que os conservadores ditassem a discussão. Em troca disso, nenhum republicano votou na versão da Câmara do plano -mais focada do que o plano original do governo. Republicanos no Senado lançaram invectivas contra o suposto "clientelismo" e criticaram os custos do pacote -mas 36 de 41 senadores republicanos votaram por substituí-lo por US$ 3 trilhões em cortes nos impostos em dez anos.
Assim, Obama se viu reduzido a barganhar votos de centristas -que cobraram caríssimo apenas para demonstrar seu poder de fogo. Eles provavelmente teriam exigido que US$ 100 bilhões fossem cortados de qualquer coisa que Obama pedisse; ao fazer uma proposta inicial tão baixa, o presidente assegurou um pacote final pequeno demais. Agora os negociadores da Câmara e do Senado terão que conciliar suas versões do pacote, e é possível que o plano final desfaça os piores danos.
Mas esta foi a melhor chance de Obama fazer aprovar uma ação decisiva, e ele deixou a desejar. Em vez de admitir o fracasso da sua estratégia política e o dano causado à sua estratégia econômica, o presidente tentou encarar a coisa sob uma ótica suprapartidária positiva.
"Democratas e republicanos se uniram no Senado e responderam apropriadamente à urgência que exige o momento atual", disse Obama sábado, "e a escala e o âmbito deste plano estão certos". Não, eles não o fizeram, e não, a escala e o âmbito do plano não estão certos.


Tradução de CLARA ALLAIN


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