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ANÁLISE
Obama vira o jogo na esfera nuclear
PHILIP STEPHENS
DO "FINANCIAL TIMES"
ENTÃO ELE não é
Jimmy Carter, afinal de
contas. Barack Obama
assinou um tratado de redução
de armas estratégicas com a
Rússia. Na próxima semana, receberá 50 líderes mundiais para discutir o fortalecimento dos
dispositivos de segurança nuclear. No intervalo, divulgou
nova estratégia militar que limita significativamente as circunstâncias em que os EUA
usariam seu arsenal nuclear.
Esses três acontecimentos
assinalam uma estação importante na rota que ele mapeou
em um discurso proferido na
capital tcheca um ano atrás.
Ainda estamos a anos-luz de
distância do mundo sem armas
nucleares que ele mencionou
então. Mas deixamos de andar
na direção errada. As iniciativas mais recentes restauraram
ímpeto à redução de armas nucleares. O colapso do Tratado
de Não Proliferação Nuclear
não está parecendo tão inevitável quanto antes.
Isso põe Obama longe das caricaturas dele que vinham sendo feitas há dois ou três meses.
Mesmo observadores favoráveis traçavam comparações
com as calamidades de política
externa do governo Carter.
O estilo meditativo do presidente destoa da impaciência de
uma cultura política moldada
por notícias transmitidas 24
horas por dia. Mas a percepção
de fracasso sempre foi prematura. Ela refletia uma crença
pouco realista na ideia de que o
país mais poderoso do mundo
sempre consegue impor sua
vontade. Os desafios de política
externa não podem todos ser
"resolvidos". Alguns precisam
ser administrados.
O momento de virada para
Obama se deu com a aprovação
da reforma do sistema de saúde. De um dia para outro, o líder
assediado por críticas virou um
Titã que realizara algo que seus
predecessores mais ilustres
não tinham conseguido.
A percepção de que Obama
reconstruiu a autoridade política em casa faz com que seja levado mais a sério fora dos EUA.
Na política, o êxito gera mais
êxito. Mas, por mais que tenha
sido tolice tratá-lo como letra
morta algumas semanas atrás,
seria igualmente errado imaginar que tudo será fácil agora.
Em julho passado, comparei
Obama a um enxadrista que joga várias partidas simultaneamente. Em lugar de encarar os
desafios de política externa sequencialmente, ele tinha feito o
lance de abertura de todas as
partidas importantes. Mas cada
uma delas está se mostrando
mais difícil que ele imaginou.
A Casa Branca transmitiu a
Israel, com atraso, que a suspensão das construções em territórios palestinos é uma precondição para um acordo de
paz. Mas isso, por si só, não é
garantia de avanços.
As ações recentes do presidente afegão, Hamid Karzai,
ressaltaram quão difícil será
conseguir vencer a luta contra
o Taleban. A paralisia política
em Bagdá coloca em risco o
cronograma da retirada das
tropas americanas do Iraque.
A assinatura da Rússia no novo Start não abranda suas ambições de reafirmar sua influência no antigo espaço soviético. O degelo nas relações
com a China pode ser tão breve
quanto o gelo que o precedeu.
E há o Irã, partida em que os
trunfos são maiores. E Obama
pode muito bem perdê-la.
Analogias com Carter à parte, porém, Obama facilitou sua
vida, embora isso não signifique que baste ele desejar para
pôr fim aos problemas do mundo. Em xadrez ou política externa, ter o final de jogo almejado em vista não garante êxito.
Mas é um começo bem útil.
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