São Paulo, quinta-feira, 10 de junho de 2004

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

REINO UNIDO

Reeleição de Livingstone, hoje, é ameaçada por sua volta ao partido de Blair, malvista por pacifistas, sua base de apoio

Guerra do Iraque afeta eleição londrina

FÁBIO ZANINI
FREE-LANCE PARA A FOLHA, EM LONDRES

Ex-"Ken, o Vermelho, líder da esquerda maluca", seu apelido nos anos 80, Ken Livingstone é o favorito para ser reeleito hoje prefeito de Londres. Mas ele pode ser surpreendido por um grupo que sempre teve como aliado: os ativistas antiguerra.
Livingstone enfrenta o desgaste de ter voltado ao Partido Trabalhista em janeiro, quatro anos após ter sido banido pelo primeiro-ministro, Tony Blair, por seu radicalismo.
Na semana passada, a Folha testemunhou uma cena emblemática da decepção que o prefeito causou em antigos simpatizantes ao fazer as pazes com Blair. Ao final de um evento de campanha, um jovem anarquista dirigiu-se a ele aos gritos: "Que tipo de socialista é você, que volta para o partido que bombardeou o Iraque?" A poucos metros, o prefeito apenas sorriu, constrangido. Uma de suas assessoras tentava explicar: "Veja, o Partido Trabalhista não é apenas Tony Blair...".
Para mostrar que não mudou, Livingstone tem chamado de "criminoso de guerra" o presidente dos EUA, George W. Bush, de quem Blair é o principal aliado.
Segundo pesquisa do jornal "The Times", Livingstone lidera as intenções de voto, com 42%, contra 29% de Steven Norris (conservador) e 20% de Simon Hughes (liberal-democrata). Mas outros 11% votariam nele se não tivesse retornado à sigla de Blair. Já um levantamento do jornal "The Independent" mostra Livingstone com 37%, contra 26% para Norris e 17% para Hughes.
"Livingstone fez uma aposta de alto risco, calculando que sofre um desgaste administrável agora, mas lucra no longo prazo por voltar ao partido que está no governo", diz Paul Kelly, da London School of Economics.

Pedágio urbano
Prefeito, Livingstone trocou o esquerdismo dos tempos de presidente da Câmara de Londres, nos anos 80, quando atacava a "exploração burguesa do trabalho", pelo pragmatismo. No evento que a Folha acompanhou, justificou assim o retorno ao partido: "Desde que voltei obtive financiamento para uma nova ponte e para estender o metrô".
Adversários dizem que ele não é tão imbatível como parecia. Norris o acusa de ser "fraco com criminosos e refém de sindicatos". Hughes explora o tema do Iraque.
Mas o prefeito ainda é visto como favorito por analistas, conseqüência de algumas obras de impacto, como o pedágio para carros que trafegam no centro, que reduziu os congestionamentos em até 30%. Também ousou mudar o projeto de 160 anos da Trafalgar Square, principal praça da cidade, restringindo o acesso de veículos e expulsando os vendedores de milho, que atraíam pombos -para decepção de turistas.
"O pedágio urbano e a obra na Trafalgar são importantíssimos para Livingstone, mostram decisão na hora de fazer ações difíceis, mas necessárias", disse Derek Turner, consultor de transporte responsável pela implantação dos projetos na prefeitura.
As ações, por serem polêmicas, também geram resistência. O pedágio urbano é rejeitado por 44% da população (48% aprovam). Setores do comércio reclamam do prejuízo: a loja de departamentos John Lewis, uma das maiores da Oxford Street, a principal rua comercial do centro, acusou queda de 5% no movimento.
"No final das contas, apesar de o trânsito estar melhor, é mais uma taxa a pagar", disse um agente de seguros que dirigia para o centro e agora pega ônibus.
Outra marca da gestão Livingstone foi o estilo populista. Ele faz questão de ir trabalhar de metrô, está sempre cercado de artistas e representantes de minorias étnicas e chamou recentemente de "idiotas" motoristas que levam filhos em grandes carros às escolas.
A fórmula tem surtido efeito: na semana passada, a revista conservadora "The Economist" pediu votos para ele em editorial. E Blair, que havia quatro anos chamava o prefeito de "desgraça", teve de engolir as palavras para não correr o risco de derrota.


Texto Anterior: Israel: Sharon planeja começar retirada dos colonos de Gaza em agosto
Próximo Texto: Extrema direita britânica pode surpreender
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.