São Paulo, segunda-feira, 10 de julho de 2006

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ARTIGO

Falcões empoleirados

Para especialista americano, recente relação dos EUA com o Irã e a Coréia do Norte indica que houve uma guinada da política externa no caminho do diálogo

NEWTON CARLOS
ESPECIAL PARA A FOLHA

OS "FALCÕES" , que compõem a linha-dura do governo Bush, estão em baixa. Pelo menos é o que constata Joseph Cirincione, especialista em questões de diplomacia nuclear do Carnegie Endowment for International Peace, com base em Washington. Cirincione tomou como referência imediata a reversão na política americana de isolamento do Irã, sustentada durante 27 anos por vários presidentes. Tornou-se mais agressiva com Bush, diante da descoberta de que o Irã desenvolveu em segredo, durante muito tempo, um programa nuclear sob suspeita de ambições armamentistas. As reações "moderadas" aos foguetes da Coréia do Norte fortalecem o que o Carnegie define como "forte guinada diplomática".
John Bolton, que no Departamento de Estado decretou como letra morta vários acordos negociados, assinados e ratificados e era muito mais duro e arrogante com a Coréia do Norte, apresenta-se agora como um bem enquadrado embaixador dos EUA na ONU. O tom foi dado pela secretária de Estado, Condoleezza Rice. Dialogar é ainda o mais recomendável como meio de reduzir tensões e até sair da crise.
Os que administravam o comportamento belicista de Bolton -o vice-presidente Dick Cheney e Donald Rumsfeld, secretário da Defesa- mostram-se cada vez mais "passivos e relutantes".
Embora conservando a retórica de "manter o rumo" e "completar o serviço", o próprio Bush ficou menos triunfalista em relação ao Iraque. Também admitiu erros, procurando criar um consenso internacional pró-amparo ao novo governo iraquiano.
Os acontecimentos se chocam com a doutrina Bush. Ela manda tratar como terroristas os que promovem terrorismo ou dão cobertura a ele, e o Irã é encarado pela Casa Branca como cabeça e caixa de ampla geografia terrorista. Um de seus protegidos seria o grupo terrorista Hezbolah, do Líbano. A Coréia do Norte faz parte do "eixo do mal".
Em tempos de maior dureza e de unilateralismo intransigente, quando os neoconservadores sustentavam a opção militar como a "solução" mais indicada para a questão nuclear iraniana, alguns falcões disseram a Bush que ele errou na invasão do país de quatro letras começando com "i". O Iraque ("Iraq" em inglês) não tinha armas de destruição massa, o Irã ("Iran") já fazia a bomba.
A guinada em relação ao Irã, que de algum modo se projeta na crise com a Coréia do Norte, é comparada, em grau de importância, à viagem secreta de Kissinger a Pequim e ao estabelecimento de relações dos EUA. O próprio Kissinger sugeriu que Rice faça o mesmo em relação ao Irã. Mas, por enquanto, a oferta é de negociações multilaterais. E Cirincione, embora convencido de que os pragmáticos se sobrepõem aos ideólogos -os falcões-, avisa que não se trata de nocaute.


O jornalista NEWTON CARLOS é analista de questões internacionais


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