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O GÊNERO DO TERROR
"Viúvas negras" tchetchenas tomaram parte em todos os atentados recentes na Rússia
Mulher assume papel-chave em ataques
MÁRCIO SENNE DE MORAES
DA REDAÇÃO
A recente e brutal onda de
atentados ocorrida na Rússia,
que deixou mais de 400 mortos,
incluindo inúmeras crianças, explicitou o crescente papel desempenhado por mulheres suicidas nas estruturas armadas do
terrorismo islâmico.
Os quatro atentados ocorridos
na Rússia nas últimas semanas
tiveram mulheres como protagonistas. Foram elas que carregavam as bombas que derrubaram dois aviões Tupolev no centro do país em 24 de agosto, matando 89 pessoas. Uma mulher-bomba matou nove no metrô de
Moscou uma semana depois. E,
segundo autoridades russas,
mulheres portando cintos-bomba foram encontradas entre os
mais de 300 mortos de Beslan.
De acordo com analistas ouvidos pela Folha, trata-se de uma
mudança no "modus operandi"
do terrorismo islâmico.
"O uso de mulheres nos atentados suicidas constitui uma real
mudança no modo como os extremistas islâmicos lidam com
elas. Antes, eles tendiam a relegá-las ao segundo plano, às tarefas auxiliares, mas agora passaram a permitir que elas desempenhem papéis cruciais nas missões", explicou Diederik Lohman, especialista em Tchetchênia da Human Rights Watch.
A primeira vez em que mulheres tiveram um papel vital num
atentado terrorista foi em 2002,
quando terroristas tchetchenos
fizeram mais de 700 reféns num
teatro de Moscou. Ao menos 18
dos seqüestradores eram mulheres, de acordo com autoridades
russas. No mesmo ano, as primeiras mulheres suicidas palestinas surgiram em Israel. Hoje
grupos terroristas como o Hamas palestino já admitem o recrutamento de mulheres.
Como salientou Mark Kramer,
especialista em Rússia da Universidade Harvard, o fenômeno
tem razões simbólicas e práticas.
"O simbolismo é muito forte,
pois, com isso, os terroristas islâmicos buscam mostrar que os
algozes são, na verdade, vítimas,
agindo de modo violento por
conta da situação desesperadora
em que se encontram. As "viúvas
negras" tchetchenas encarnam
perfeitamente esse modelo. Afinal, perderam maridos ou filhos
na década de conflitos com os
russos", apontou Kramer.
"Ademais, como são normalmente consideradas, tanto no
Ocidente quanto nos mundos
árabe e muçulmano, protetoras
de vidas, não exterminadoras de
civis, por serem mães, as mulheres tchetchenas são retratadas,
ao menos em parte, pela mídia
internacional como vítimas da
truculência militar russa."
Organizações de defesa dos direitos humanos, como a Anistia
Internacional e a Human Rights
Watch, acusam a Rússia de cometer atrocidades na Tchetchênia, incluindo assassinatos extrajudiciais, estupros, tortura generalizada e desaparecimentos.
Ainda para Kramer, a questão
prática é muito relevante. "Desde o 11 de Setembro, os serviços
de segurança da maior parte dos
países têm como principais suspeitos jovens muçulmanos de
aparência árabe", avaliou.
"Assim, de acordo com minha
colega Jessica Stern [especialista
em terrorismo da Universidade
Harvard], a percepção de que as
mulheres são menos inclinadas
a cometer atos violentos, o modo estrito como as muçulmanas
se vestem e a dificuldade em realizar revistas nas mulheres islâmicas as tornaram um alvo perfeito para recrutadores de grupos terroristas islâmicos."
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