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Morador acampa em prédio para defender cidade
DO ENVIADO A GRIGNY
Os olhos do "colaborador"
estão em brasa, e suas olheiras
são profundas. Ele tem os cabelos desgrenhados, a barba por
fazer e não cheira muito bem.
O "colaborador" -assim ele
pede para ser identificado-
está na sede da Prefeitura de
Grigny, na periferia sul de Paris, a 25 km da capital.
Ontem era esse o seu quartel-general, mas hoje pode ser uma
escola e amanhã um ginásio esportivo. Ele integra um batalhão comunitário que, desde o
agravamento dos distúrbios
sociais na cidade, tem dormido
nos prédios públicos e feito
ronda pelas ruas da cidade de
25 mil habitantes.
Foi em Grigny que, no último
sábado, tiros disparados por
rebeldes feriram dois polícias.
Foi lá também que duas escolas, uma de ensino primário e
um jardim de infância, foram
queimadas no final de semana,
tornando o local um dos mais
policiados da região metropolitana nos últimos dias.
A violência levou os moradores a promoverem os acampamentos e as rondas. O "colaborador" não está disposto a dar
detalhes de como foi a sua última noite. É evidente que tem
dormido mal, parece um farrapo humano. Conta apenas que
a madrugada foi mais calma
que as anteriores.
Sua justificativa para fugir
dos detalhes é o receio de despertar ainda mais a ira dos baderneiros. "Não queremos
promoção, isso cria uma bola
de neve, pode provocá-los."
A Folha conversou com outros moradores de Grigny para
perceber como é o processo.
A partir do final da tarde, os
voluntários se encontram nos
prédios públicos do município.
Dividem-se em grupos de quatro a oito pessoas e rumam para a sua "trincheira". Deixam
acesas todas as luzes do local,
levam rádio, comida, colchões
e cobertores. E extintores de incêndio, caso não haja um no
prédio. Segundo os participantes, ninguém usa armas.
Outros moradores circulam a
pé pelos quarteirões onde estão
esses prédios, verificando se tudo está bem. De manhã se dispersam, voltando a se encontrar à noitinha para uma nova
jornada.
A iniciativa foi adotada na semana passada, mas só foi depois do último final de semana,
o mais violento desde o início
dos distúrbios, que se tornou
mais efetiva. Uma reunião na
sede da prefeitura na última segunda organizou o mutirão.
Madame Aurélie (nome fictício) esteve lá. Com cerca de 75
anos, diz não ter mais condições de integrar os grupos de
vigilância, mas quer participar
da proteção ao território onde
vive. Vizinha de uma das escolas incendiadas, conta que ligou para os bombeiros às 7h15
do domingo, evitando a perda
total do prédio.
"A polícia já tem muito a fazer, não podemos depender só
dela. E o bom dos grupos é que
são totalmente pacíficos. Não é
milícia, isso tem de ficar claro."
A prefeitura não adotou o toque de recolher. Coincidência
ou não, depois que os grupos
de voluntários foram reforçados, não houve prédios ou carros queimados.
(FÁBIO VICTOR)
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