São Paulo, segunda-feira, 10 de dezembro de 2007

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Palmas e dinamite espocam na noite tensa em Oruro

Juan Karita/Associated Press
Simpatizantes de Evo Morales fazem vigília diante da Assembléia Constituinte em Oruro


Apoiadores do governo "blindam" Assembléia, barrando saída de constituintes e da mídia

Cidade escolhida como nova sede para Assembléia é reduto de Morales e recebeu legisladores após meses de confronto em Sucre

DA ENVIADA A ORURO

Caía a tarde de sábado quando começou a chegar ao Centro de Convenções de Oruro um colorido grupo de simpatizantes do governo Evo Morales à espera da aprovação da nova Constituição que, para a maioria indígena do país, representa a "refundação" da Bolívia e a correção de anos de racismo.
Aplausos aclamavam os assembleístas indígenas, que davam entrevista em quéchua ou aimará às rádios locais.
O clima pouco depois, porém, não era de festa. O objetivo declarado dos manifestantes era blindar a Assembléia Constituinte de possíveis ataques oposicionistas, como ocorreu durante meses na cidade de Sucre -quando a imprensa local registrou ofensas racistas a parlamentares. Um grupo de mineiros estourava, esporadicamente, dinamites ao redor do prédio em celebração e ameaça.
A sessão começou com a presidente da Assembléia, Silvia Lazarte, elogiando os apoiadores. "Queria pedir uma salva de palmas para nossos irmãos que estão garantindo a segurança do lado de fora", disse ela, dirigente indígena de Santa Cruz.
Improvisando fogueiras contra o frio, um grupo ouvia a sessão pelo rádio do lado de fora. Alguns, munidos de pedaços de pau. "Não vamos atacar ninguém. É para nos proteger", disse o mineiro Luis Aguillar, 32. "Para ser honesto, não votei no Evo. Mas ele está fazendo mais do que qualquer outro. E a Constituição é a primeira coisa que não é para eles. É para os pobres", completou o pedreiro Carlos Flores, de origem quéchua. Flores tem seis filhos, contemplados com a versão local do Bolsa Escola, o "Juancito Pinto", que Morales promove.
Às 2h da manhã, porém, já era praticamente impossível para assembleístas e jornalistas -sobretudo os de TVs oposicionistas- sair do edifício. Os apoiadores da Carta estavam acompanhados então de manifestantes radicais da cidade de El Alto. "Meia-lua não passará", gritavam em referência ao oriente do país, que faz ferrenha oposição a Morales. "Ninguém sai antes de aprovar! Bolívia de pé, nunca de joelhos!"
A reportagem da Folha tentou sair do prédio, mas foi desencorajada pela polícia, do lado de dentro, e pelos gritos de manifestantes, do lado de fora: "Jornalista, volte a trabalhar"; "Está com fome? Eu também!".
Oruro, 230 km ao sul de La Paz, foi escolhida para a sessão-chave da Constituinte exatamente por ser um dos redutos de Morales -o departamento (Estado) que tem o mesmo nome da capital é um dos três, do total de nove departamentos (Estados) bolivianos, comandado por governistas, além de contar com grupos de movimento sociais e mineiros simpáticos ao presidente.
Não houve incidentes, mas as ameaças duraram toda a madrugada. A tensão só diminuiu com a aprovação da Carta. às 12h de domingo, o grupo foi engrossado por uma marcha de manifestantes que, seguida por bandas de música tocando o hino nacional, comemoraram nos arredores. (FLÁVIA MARREIRO)

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