São Paulo, segunda-feira, 11 de janeiro de 2010

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Vice e oposição se articulam para conter a Casa Rosada

Julio Cobos arma sessão extraordinária no Congresso para intervir em crise

Último foco de confusão é a tentativa do governo de demitir o diretor do Banco Central; medidas do caso estão desde sexta sub judice

SILVANA ARANTES
DE BUENOS AIRES

O vice-presidente da Argentina, Julio Cobos, e a oposição ao governo Cristina Kirchner no Congresso aceleram hoje a estratégia de convocar, à revelia de Cristina, sessão extraordinária do Parlamento, para intervir na crise política em que a Casa Rosada se emaranhou, no fim da semana passada.
Em tese, apenas a presidente poderia convocar reuniões extraordinárias do Congresso, que está em recesso. Contudo, Cobos julga que a dimensão e a raiz da crise ocasionam a brecha legal para a "autoconvocação" do Senado, que ele preside -atribuição dada ao vice-presidente da República, segundo a Constituição argentina.
Numa reunião com líderes de bancada, ele estimará o quorum e procurará fechar a data da sessão. Cristina tenta frear a iniciativa, impedindo a participação da bancada governista.
O ex-presidente Néstor Kirchner, marido de Cristina e atual deputado, acusou Cobos de conspirar para derrubar o governo e de trair sua função de vice-presidente. Cobos reagiu dizendo que "o marco ético do papel do vice-presidente não pode ser o silêncio e a submissão a decisões que não foram nem sequer consultadas".
A Casa Rosada está encurralada pela contestação judicial a dois decretos que Cristina baixou na condição de "necessidade e urgência". É um mecanismo semelhante à medida provisória brasileira, que deve contar com a ratificação do Congresso -daí a convocação de Cobos para analisá-los.
O primeiro decreto, de 15 de dezembro passado, criou um fundo de US$ 6,5 bilhões com reservas do Banco Central, para garantir o pagamento da dívida externa em 2010.
O segundo decreto, da sexta passada, removeu de seu cargo o presidente do BC, Martín Redrado, que resistia em transferir as reservas para o fundo.
Redrado diz temer que o dinheiro seja embargado por outros credores da dívida argentina -os que recusaram a negociação do calote de 2001 e buscam ressarcimento na Justiça.
Partidos de oposição pediram à Justiça a anulação do decreto que criou o fundo, até que o Congresso se pronuncie a respeito. Redrado recorreu de sua exoneração. A juíza María José Sarmiento deferiu os dois pedidos. Redrado retomou seu cargo na sexta à tarde. Mas, como cabe recurso à decisão da juíza, o comando do Banco Central está indefinido, o que provoca reflexos negativos no mercado.
Acentuando ainda mais a crise, a Casa Rosada acionou a Polícia Federal para localizar Sarmiento, que, segundo o governo, obstruiu a apelação, ao ficar incomunicável depois de deferir o recurso a Redrado. Sarmiento nega a acusação e afirma sentir-se "pressionada" pela exibição do aparato policial promovida pelo governo.
O êxito da tentativa de Cobos de devolver "tranquilidade e harmonia" ao país, que diz ser sua meta, poderia render dividendos eleitorais ao vice-presidente, aspirante à sucessão de Cristina. Embora seu vice, Cobos rompeu com ela em 2008.
A partir de hoje, a Justiça tem prazo de 48 horas para analisar os recursos com que o governo tenta restituir a validade dos dois decretos, o que pode arrastar o impasse no Banco Central. Mesmo se a decisão for favorável ao governo, a questão poderá ir à Suprema Corte.


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