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Europeus elegem direita para lidar com bolso e imigração
Conservadores consolidam supremacia com vitória na Itália e nas municipais britânicas
Movimento reflete crise de
identidade da esquerda e
sintonia maior da direita com as preocupações do
eleitorado, dizem analistas
SAMY ADGHIRNI
DA REPORTAGEM LOCAL
A proliferação de governos
de direita à frente dos principais países europeus, uma década depois da "onda rosa" social-democrata, reflete ao mesmo tempo uma alternância cíclica na preferência do eleitorado e uma maior sintonia dos
conservadores com as preocupações dos eleitores.
A avaliação foi feita por observadores da vida política européia, consultados pela Folha
a respeito da guinada iniciada
em 2005 com a derrota dos social-democratas nas legislativas alemãs e a chegada ao poder de Angela Merkel.
O movimento vem se acentuando desde então.
Silvio Berlusconi acaba de
reassumir o governo da Itália.
Os conservadores britânicos
obtiveram uma vitória arrasadora nas eleições municipais
do último domingo, faturando
até a Prefeitura de Londres. E
Nicolas Sarkozy, mesmo desgastado, festejou na semana
passada seu primeiro ano na
Presidência francesa.
A tendência se reflete também em países menores como
Dinamarca, Bélgica e Holanda,
dando à direita um momento
de supremacia incontestável
no Velho Continente.
Para o analista belga Jean-Benoit Pilet, o movimento traduz uma renovação cíclica que
é natural.
"Os anos 50 a 70 foram da esquerda. A direita voltou com
um programa neoliberal nos
anos 80. Na década seguinte, a
esquerda ressurgiu com o novo
perfil ideológico da Terceira
Via, com Tony Blair, Massimo
D'Alema, Gerhard Schröder e
Lionel Jospin", diz Pilet, numa
referência ao misto de liberalismo econômico e bem-estar
social defendido pelos dirigentes de Reino Unido, Itália, Alemanha e França na segunda
metade dos anos 90.
O inglês Tony Judt também
enxerga ciclos nos rumos políticos da UE, mas ele relativiza a
coerência desses movimentos.
"Não acho que tenha havido
uma "onda rosa" padronizada
dez anos atrás. Blair, por exemplo, era muito mais próximo de
Thatcher [Margaret, a ex-premiê conservadora britânica] do
que qualquer socialista europeu", diz Judt.
Segundo Pascal Delwit, reitor da faculdade de Ciências
Políticas da Universidade Livre
de Bruxelas, a esquerda européia é responsável pelo próprio
desamparo.
"Os governos social-democratas não conseguiram enfrentar problemas como o aumento da desigualdade social e a reforma fiscal e, portanto,
não conquistaram apoio de
longo prazo", diz Delwit, que
cita a recente derrota trabalhista nas legislativas britânicas como um caso típico de
desgaste no poder.
Segundo Judt, a perda de
identidade dos partidos de esquerda confundiu o eleitorado.
"Os trabalhistas britânicos, os
socialistas franceses e os social-democratas alemães adotaram políticas tão próximas
de seus rivais de centro e direita que, em vez de ganhar novos
eleitores, acabaram perdendo
muitos deles."
Sinal dos tempos, o Partido
Socialista francês, que vem
perdendo espaço para pequenas legendas esquerdistas, tenta se reinventar ideologicamente com a preparação de um
novo estatuto, que será oficialmente adotado na convenção
do partido, no mês que vem.
Na Alemanha, o Partido Social-Democrata (SPD), embora
integre a coalizão de governo,
aposta nas eleições parlamentares de 2009 para recuperar o
prestígio e a força de outrora.
Antes de definir o oponente
de Merkel, o SPD luta para encontrar um novo rumo. O partido, dividido entre uma ala social e outra mais pragmática, já
está ameaçado pelo Die Linke,
formação à esquerda, que reúne dissidentes social-democratas e os herdeiros do antigo PC
da Alemanha Oriental.
Tony Judt insiste em que a
direita se fortaleceu ao dar
prioridade a temáticas mais
afinadas com as preocupações
cotidianas dos europeus, como
a alta da criminalidade e a relação com os imigrantes, assuntos cuja importância foi subestimada pela esquerda (leia entrevista à pág. A23).
O pesquisador italiano Fabio
Liberti, radicado em Paris, sustenta que a supremacia da direita nos grandes países europeus -com exceção da Espanha, onde os socialistas venceram as eleições de março - se
deve essencialmente à capacidade dos conservadores de oferecerem soluções econômicas
que parecem mais eficientes a
curto prazo. "Os eleitores votam pensando no bolso", diz.
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