São Paulo, terça-feira, 11 de novembro de 2008

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SUCESSÃO NOS EUA / ARTIGO

Dias de cão para os republicanos

Ao prometer animal às filhas, Obama aliou competência a calor humano, combinação poderosa

WILLIAM KRISTOL
DO "NEW YORK TIMES"

Pouco antes da meia-noite do dia 4 de novembro, eu não estava tão preocupado. Os resultados da eleição haviam sido ruins, mas não devastadores.
Obama vencia McCain mais ou menos pela margem que Bill Clinton conseguiu sobre George Bush pai em 1992, e assumiria o poder em janeiro com maiorias legislativas semelhantes às de Clinton em 1993.
Bem, Newt Gingrich conseguiu liderar uma tomada de controle do Congresso pelos republicanos apenas dois anos mais tarde. E depois de sua vitória em 1976, Jimmy Carter contava com maiorias ainda maiores. Ronald Reagan o destroçou quatro anos depois, e sua vitória ajudou os republicanos a tomar o controle do Senado e deu início a uma era de governos conservadores.
Além disso, as pesquisas de boca-de-urna deste ano sugeriam uma alternância entre partidos, não um realinhamento ideológico. Em 2008, pessoas que se descreveram como democratas compunham 39% do eleitorado, ante 32% de republicanos. Em 2004, os dois partidos tinham cada qual 37%.
Não houve mudança na identificação ideológica dos eleitores: em 2008, 22% se definiram como "liberais" [progressistas] -ante 21% de 2004. Já os conservadores declarados foram 34% do eleitorado, sem mudança ante a eleição anterior, e 44% se definiram como moderados, ante 45% em 2004.
Em outras palavras, o ano foi bom para os democratas, mas continuamos a viver em um país de centro-direita. Os conservadores e o Partido Republicano terão chance real de recuperar sua posição -a menos que a capacidade do novo presidente transforme votos que resultaram basicamente da oposição a Bush em uma base para uma nova era de liberalismo.
E era isso que eu estava pensando quando, alguns minutos depois de iniciar seu discurso de vitória, Obama disse às suas filhas que "vocês têm direito a um novo cachorrinho que irá conosco para a Casa Branca".
Engasguei. Não por minha profunda afeição pelos cachorros. Mas porque embora todos soubéssemos há muito que Obama é um político habilidoso, ele ainda não havia mostrado um lado mais emotivo.
Competência e calor humano é uma combinação poderosa. Subitamente vieram-me à mente os grandes presidentes que realinharam o país na era moderna -Franklin Roosevelt (e seu terrier Falla) e Ronald Regan (e seu cocker Rex). Talvez um realinhamento esteja a caminho.
Naturalmente Obama teve de responder sobre o cachorrinho: "Malia [filha de Obama] é alérgica, de modo que o cachorro precisa ser hipoalergênico.
Mas nossa preferência seria por um cachorro em um abrigo de animais, mas muitos cachorros de abrigo são vira-latas como eu. Assim, definir como conseguiremos equilibrar essas duas necessidades é uma questão séria no lar dos Obama".
Com isso, Obama conseguiu aprofundar sua empatia ante todos os americanos que gostam de cães; identificar-se com cada família que tenta decidir que cachorro comprar; despertar simpatia de todos os pais de filhos alérgicos; mostrar compaixão ao citar preferência por um cachorro de abrigo; demonstrar humor seco e alguma incorreção política ao comentar que "muitos cachorros de abrigo são vira-latas como eu".
Nada mau. Podemos ter quatro ou oito anos difíceis para os conservadores.
Esse tempo será ainda mais difícil caso subestimem Obama. Sua escolha de Rahm Emmanuel como chefe-de-gabinete significa que ele não será um esquerdista inconseqüente, e que delineará uma estratégia legislativa atenta às realidades do Congresso, mas sem ceder a líderes legislativos cujos interesses podem diferir dos seus. E ele tem a vantagem de herdar uma recessão que lhe dará um ou dois anos difíceis (pelos quais não será culpado), seguidos de uma recuperação a tempo para a campanha de 2012.
Ou seja, Obama será formidável. Os conservadores deveriam ver com agrado o desafio.
É bom para o conservadorismo que os conservadores precisem desenvolver novas idéias e novos talentos políticos, se querem sucesso na era Obama. E os governadores Sarah Palin, Mitch Daniels, Bobby Jindal e os demais possíveis candidatos republicanos em 2012 fariam bem em comprar animais de estimação para seus filhos.


Tradução de PAULO MIGLIACCI


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