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Brasileira relata noite de terror no kibutz
DA REDAÇÃO
A brasileira Denise Filliez, 55,
viveu ontem uma madrugada de
terror no kibutz Metzer. Ela dormia com o marido numa casa vizinha àquela em que um terrorista palestino matou uma mulher e
seus dois filhos. Acordou assustada com o barulho da metralhadora. Fechou todas as janelas. E passou a noite no chão, longe das janelas para fugir dos disparos.
Após 28 anos no kibutz, a paulista Denise, coordenadora da
área contábil, se diz desiludida
com a violência. "Não posso nem
dizer se as pessoas que fazem isso
são animais", contou ela à Folha,
por telefone. "Que mal podiam fazer duas criancinhas, dormindo,
com chupeta na boca?"
(MS)
Folha - A sra. testemunhou o
atentado?
Denise Filliez - Era mais ou menos 23h, e estávamos dormindo.
Escutamos tiros de metralhadora
aqui bem pertinho da minha casa.
Eu e meu marido acordamos assustados. Naquele momento,
meu filho telefonou e disse: "Mãe,
estou indo para casa, já estou quase chegando". Falei que estava escutando um tiroteio e que não era
para ele vir. Desliguei, porque não
podia fazer barulho. Ele me ligou
outra vez e disse que estava vindo.
Fechamos todas as janelas -as
luzes já estavam apagadas- e fomos para o quarto. Temos orientação sobre como agir nessas situações. Ficamos sentados no
chão, num lugar longe das janelas.
Logo passou um jipe, mandando
que todos ficassem dentro de casa. Ficamos escutando o rádio
bem baixinho, para ver se davam
notícias do que estava ocorrendo.
Pouco depois, meu filho ligou.
Contou que estava ajudando a
procurar o terrorista. Ao chegar
ao portão, já havia ambulâncias e
tropas e, como ele conhece todos
os caminhos, ajudou a liderar as
buscas. Ficaram procurando até
as 5h, casa por casa. Ninguém sabia onde o atirador estava. Só no
final soubemos que ele fugiu.
O terrorista entrou na casa de
uma mulher aqui perto e matou
ela e suas duas crianças pequenas.
Depois, atirou num casal que passava do lado de fora. E ainda matou mais um homem, que se dirigiu ao local alertando a todos que
um atentado estava acontecendo.
Folha - A sra. esperava que isso
pudesse acontecer no seu kibutz?
Denise - Vivemos numa região
perigosa, perto da fronteira com
os territórios, e a tensão é muito
grande. Além disso, tenho dois filhos gêmeos de 20 anos na frente
de batalha [um é tanquista, o outro, instrutor de oficiais].
E agora acontece isso dentro da
minha própria casa. Não posso
nem ao certo dizer se as pessoas
que fazem isso são animais. Não
dá para imaginar até que ponto
alguém pode chegar para fazer isso. Que mal podiam fazer duas
criancinhas, dormindo, com chupeta na boca?
Folha - O seu kibutz é um exemplo da convivência pacífica árabe-israelense. Isso pode mudar agora?
Denise - Nosso kibutz tem ótimas relações com os árabes. Temos amizade com eles, são seres
humanos como nós. Hoje eu me
pergunto: será que podemos mesmo viver juntos? Estou desiludida, repensando o que achava certo.
Folha - A sra. tem amigos nos vilarejos árabes perto do kibutz?
Denise - Sim. Conheço muita
gente no vilarejo árabe-israelense
aqui ao lado. Nós nos visitamos,
vamos aos casamentos uns dos
outros. Isso é natural, muitos deles trabalham ou trabalharam
aqui conosco.
Todos eles vieram aqui hoje, para nos consolar e acompanhar o
enterro. Eles dizem que isso que
aconteceu é uma barbaridade.
Folha - A sra. pensou em voltar ao
Brasil ou ir viver em outro país para
fugir da violência?
Denise - Não volto ao Brasil de
jeito nenhum. Israel é a minha casa. Nesses 28 anos desde que vim
para cá, só estive uma vez no Brasil, e passeando. Não que eu não
goste do Brasil, mas se eu tiver
que sair daqui em razão disso, então os terroristas terão conquistado o seu objetivo.
Talvez num momento de muito
medo eu tenha pensado em ir embora. Mas depois, com calma, vejo que tenho que ficar aqui.
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