São Paulo, quinta-feira, 12 de novembro de 2009

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Palestinos cogitam declaração unilateral de independência

MARCELO NINIO
DE JERUSALÉM

Uma ideia que vem amadurecendo nos últimos dias na cúpula da Autoridade Nacional Palestina (ANP) pode ter seu primeiro teste internacional no Brasil: a declaração unilateral de independência.
Frustrado com o impasse no processo de paz, o presidente da ANP, Mahmoud Abbas, afirmou na última quinta que não deseja concorrer à reeleição, e prometeu anunciar novos desdobramentos em breve.
Segundo fontes próximas à ANP, um dos passos considerados por Abbas é a declaração de independência, como forma de aumentar a pressão sobre Israel. Abbas deve abordar o tema no encontro que terá com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva na próxima semana, em Salvador.
O encontro no Brasil, que será seguido de visitas oficiais a Argentina e Chile, dará início à primeira viagem internacional de Abbas desde o dramático anúncio da semana passada, que mergulhou a política palestina num mar de incerteza.
Muitos já especulam que a ANP pode estar em seus últimos dias. Outros apostam que a ameaça de não tentar renovar o seu mandato é um blefe de Abbas destinado a dobrar a resistência israelense a aceitar o congelamento da construção de assentamentos judaicos na Cisjordânia como condição para começar a negociar.
Diante das milhares de pessoas que saíram ontem às ruas de Ramallah para lembrar o quinto aniversário de morte do histórico líder palestino Iasser Arafat, Abbas não quis comentar a decisão de não disputar a próxima eleição presidencial, marcada para janeiro.
Mas rechaçou o chamado israelense para retomar o diálogo, reiterado pelo presidente Shimon Peres no Brasil. "Nós vemos Israel confiscando terras, construindo assentamentos e judaizando Jerusalém a uma velocidade sem precedentes", disse Abbas. "E depois eles ainda nos pedem para voltar a negociar."

Cálculo político
Uma declaração unilateral de independência teria pouco efeito prático, admitem políticos palestinos favoráveis à ideia, mas poderia criar um movimento internacional para amolecer a posição israelense. O ponto de partida seria o reconhecimento da ONU.
"Estamos tentando convencer o presidente a não só declarar a independência unilateralmente, mas também a propor que a Palestina se torne um membro pleno da ONU", disse à Folha o jornalista e deputado palestino Hanna Siniora.
Atualmente os palestinos contam na ONU com uma missão de observadores. Para Siniora, assim como outras personalidades da política palestina na Cisjordânia, Abbas está convencido de que chegou o momento de uma ação drástica para quebrar o impasse.
Bassem Khoury, até o mês passado ministro da Economia da ANP, acredita que uma declaração de independência aumentaria a sensação de urgência na comunidade internacional para acabar com a ocupação israelense. "Já não seria mais um país ocupando um território, mas um país ocupando outro", disse Khoury.
O ex-ministro diz que ouviu manifestações de simpatia à ideia de diversos líderes internacionais, incluindo o chefe da diplomacia da União Europeia, Javier Solana.
Em reportagem publicada há poucos dias, o jornal israelense "Haaretz" afirmou que uma possível declaração de independência palestina conta com o apoio de vários países da UE e até de alguns membros do governo americano.
Segundo o jornal, a declaração unilateral estaria numa cláusula secreta do plano apresentado em agosto pelo primeiro-ministro palestino, Salam Fayed, de reconstrução das instituições da ANP. A cláusula, afirma a reportagem, contaria inclusive com o apoio do governo Obama.
A ideia não é inédita. Em 1988, cinco anos antes do acordo de paz que criou a ANP, Iasser Arafat também fez uma declaração unilateral de independência. Se não teve resultados práticos, ao menos contou com amplo respaldo diplomático: 104 países votaram a favor da declaração na ONU, inclusive o Brasil.


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