São Paulo, terça-feira, 12 de dezembro de 2006

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"Milagre" só veio após 12 anos, empurrado por cobre

Economia sob Pinochet teve duas fases; na primeira, país teve duas recessões

Desemprego dobrou entre 1973 e 1975; segundo economista, só ditadura garantiu assimilação de custo social das reformas


MARCELO BILLI
DA REPORTAGEM LOCAL

Com o colapso argentino, no fim dos anos 90, e o desempenho sofrível das economias brasileira e mexicana no começo deste século, o Chile tornou-se a menina dos olhos dos economistas liberais. Foi o país, do ponto de vista de um economista ortodoxo, que fez todas as reformas que faltavam aos seus vizinhos e, por isso, pôde crescer mais que eles. Entre 2004 e este ano, o país teve taxa média de crescimento de 5,8%.
Para os partidários do ditador Augusto Pinochet, foi justamente ele quem plantou as sementes para o crescimento dos últimos anos quando implantou, a partir de meados dos anos 70, um programa radical de abertura comercial, ajuste fiscal e aperto monetário.
As primeiras reformas econômicas de Pinochet começaram entre 1974 e 1975. Desenhadas por um grupo de economistas de Chicago -Milton Friedman (1912-2006) chegou a ir ao país e participar de seminário de lançamento das reformas-, elas previam abertura unilateral da economia, privatização, reforma trabalhista, e apertos fiscal e monetário.
O resultado inicial foi desastroso. O desemprego dobrou entre 1974 e 1975 e a economia do país encolheu quase 13% em apenas um ano, tombo do qual só se recuperaria completamente três anos depois.
No começo dos anos 80, mais problemas. Como os demais países do mundo, o Chile foi atropelado pelo choque do petróleo e pela alta dos juros internacionais. Em 1982, o tombo foi maior do que o de 1975, de 13,6%. A economia chilena demoraria cinco anos para recuperar o terreno perdido com a recessão, que durou dois anos.
Feitas as contas, os primeiros doze anos de governo do ditador não pareciam nada animadores do ponto de vista de desempenho econômico. A taxa média de crescimento foi, entre 1973 e 1985, de pouco mais de 1%. Dados os custos sociais das reformas e o desempenho econômico destes primeiros anos, diz Simão Silber, economista da USP, é provável que apenas um regime de exceção ficasse no poder. "É inimaginável imaginar que um governo democrático sobreviveria a essa experiência desastrosa", diz ele.
A partir da segunda metade dos anos 80 a história, do ponto e vista do desempenho econômico, muda. Uma segunda leva de reformas, diz Silber, pôde colocar o país na rota do crescimento: a privatização do sistema de Previdência e um ajuste fiscal mais rigoroso ainda. De fato, a taxa de crescimento do Chile entre 1986 e 1998 salta para 7,3% ao ano, um desempenho de "tigre asiático", usando a comparação de Silber.
Mas nem tudo mudou depois da segunda onda de reformas liberais. O ritmo de crescimento do país continuou sendo ditado pelo preço de um, e apenas um produto, o cobre. A conclusão da onda de reformas liberais se dá justamente quando o preço do produto, cuja tendência foi de queda durante as décadas de 60 e 70, começa a subir. Entre 1986 e 2000, o preço do cobre se estabiliza, de lá para cá, sobe até voltar, nos últimos meses, aos níveis recordes dos anos 60.
É digno de nota que o programa de reformas não chegou ao cobre, ainda nas mãos do governo chileno. O produto ainda responde por 40% das exportações do país, seguido de longe por frutas, com 5% do total.
Não mudou a distribuição de renda também. O Chile está entre os países com maior concentração de riqueza do mundo, muito perto do Brasil e de seus pares latino-americanos.
A volta da democracia não trouxe mudanças econômicas, pelo menos não no sentido de desfazer as reformas de Pinochet. Mas o receio de que problemas com o cobre voltem a abater a economia chilena fez com que o governo adotasse um programa de "superávit estrutural". Economizará recursos enquanto os preços do cobre estiverem acima de sua média histórica para, quando e se os preços caírem abaixo da média, poder gastá-los e evitar queda muito drástica no nível de atividade.


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