|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
"Milagre" só veio após 12 anos, empurrado por cobre
Economia sob Pinochet teve duas fases; na primeira, país teve duas recessões
Desemprego dobrou entre 1973 e 1975; segundo economista, só ditadura garantiu assimilação de custo social das reformas
MARCELO BILLI
DA REPORTAGEM LOCAL
Com o colapso argentino, no
fim dos anos 90, e o desempenho sofrível das economias
brasileira e mexicana no começo deste século, o Chile tornou-se a menina dos olhos dos economistas liberais. Foi o país, do
ponto de vista de um economista ortodoxo, que fez todas
as reformas que faltavam aos
seus vizinhos e, por isso, pôde
crescer mais que eles. Entre
2004 e este ano, o país teve taxa
média de crescimento de 5,8%.
Para os partidários do ditador Augusto Pinochet, foi justamente ele quem plantou as
sementes para o crescimento
dos últimos anos quando implantou, a partir de meados dos
anos 70, um programa radical
de abertura comercial, ajuste
fiscal e aperto monetário.
As primeiras reformas econômicas de Pinochet começaram entre 1974 e 1975. Desenhadas por um grupo de economistas de Chicago -Milton
Friedman (1912-2006) chegou
a ir ao país e participar de seminário de lançamento das reformas-, elas previam abertura
unilateral da economia, privatização, reforma trabalhista, e
apertos fiscal e monetário.
O resultado inicial foi desastroso. O desemprego dobrou
entre 1974 e 1975 e a economia
do país encolheu quase 13% em
apenas um ano, tombo do qual
só se recuperaria completamente três anos depois.
No começo dos anos 80, mais
problemas. Como os demais
países do mundo, o Chile foi
atropelado pelo choque do petróleo e pela alta dos juros internacionais. Em 1982, o tombo
foi maior do que o de 1975, de
13,6%. A economia chilena demoraria cinco anos para recuperar o terreno perdido com a
recessão, que durou dois anos.
Feitas as contas, os primeiros
doze anos de governo do ditador não pareciam nada animadores do ponto de vista de desempenho econômico. A taxa
média de crescimento foi, entre
1973 e 1985, de pouco mais de
1%. Dados os custos sociais das
reformas e o desempenho econômico destes primeiros anos,
diz Simão Silber, economista
da USP, é provável que apenas
um regime de exceção ficasse
no poder. "É inimaginável imaginar que um governo democrático sobreviveria a essa experiência desastrosa", diz ele.
A partir da segunda metade
dos anos 80 a história, do ponto
e vista do desempenho econômico, muda. Uma segunda leva
de reformas, diz Silber, pôde
colocar o país na rota do crescimento: a privatização do sistema de Previdência e um ajuste
fiscal mais rigoroso ainda. De
fato, a taxa de crescimento do
Chile entre 1986 e 1998 salta
para 7,3% ao ano, um desempenho de "tigre asiático", usando
a comparação de Silber.
Mas nem tudo mudou depois
da segunda onda de reformas
liberais. O ritmo de crescimento do país continuou sendo ditado pelo preço de um, e apenas
um produto, o cobre. A conclusão da onda de reformas liberais se dá justamente quando o
preço do produto, cuja tendência foi de queda durante as décadas de 60 e 70, começa a subir. Entre 1986 e 2000, o preço
do cobre se estabiliza, de lá para
cá, sobe até voltar, nos últimos
meses, aos níveis recordes dos
anos 60.
É digno de nota que o programa de reformas não chegou ao
cobre, ainda nas mãos do governo chileno. O produto ainda
responde por 40% das exportações do país, seguido de longe
por frutas, com 5% do total.
Não mudou a distribuição de
renda também. O Chile está entre os países com maior concentração de riqueza do mundo, muito perto do Brasil e de
seus pares latino-americanos.
A volta da democracia não
trouxe mudanças econômicas,
pelo menos não no sentido de
desfazer as reformas de Pinochet. Mas o receio de que problemas com o cobre voltem a
abater a economia chilena fez
com que o governo adotasse
um programa de "superávit estrutural". Economizará recursos enquanto os preços do cobre estiverem acima de sua média histórica para, quando e se
os preços caírem abaixo da média, poder gastá-los e evitar
queda muito drástica no nível
de atividade.
Texto Anterior: "O Chile não pode esquecer", afirma Bachelet Próximo Texto: Artigo: Pinochet, traição e embuste econômico Índice
|