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entrevista
"EUA ajudaram a criar condições para o golpe"
FABIANO MAISONNAVE
EM LA PAZ
A morte do ditador chileno
Augusto Pinochet foi um alívio apenas para ele mesmo,
segundo o pesquisador americano Peter Kornbluh, que
elogiou a atuação da Justiça
chilena nos crimes cometidos durante a ditadura militar (1973-1990).
Kornbluh é autor de "The
Pinochet File" (arquivo Pinochet), o mais importante
livro sobre o envolvimento
do governo Richard Nixon
(1969-74) no golpe de 1973.
Leia, a seguir, entrevista concedida por telefone à Folha:
FOLHA - A morte de Pinochet foi
um alívio para a Justiça, para a direita, para o governo de esquerda
de Bachelet ou para todos eles?
PETER KORNBLUH - A morte de
Pinochet foi um alívio só para ele mesmo. Os últimos
meses e anos de sua vida foram gastos com seus processos legais: ele perdeu sua
imunidade, foi indiciado, viu
sua família, inclusive sua
mulher e sua filha, ser levada
a prisões militares e a centros de detenção, presas por
envolvimento em casos de
corrupção. Houve o seu próprio caso de corrupção, com
seus US$ 28 milhões em
mais de cem contas secretas
nos EUA e fora do Chile. Para
as suas vítimas, sua morte
significa perder o último
acerto de contas judicial.
FOLHA - O processo contra Pinochet tem sido considerado um
teste para a democracia chilena.
Sua morte antes da decisão final
anulou essa prova de fogo?
KORNBLUH - Não há dúvida de
que desde maio de 2000,
quando Pinochet voltou de
Londres pensando que se livraria de todos os seus crimes contra os direitos humanos, o Chile se estabeleceu
como um líder na América
Latina e no mundo em tentar
trazer o ex-general e seus subordinados à Justiça. O chefe
do serviço de inteligência,
Manuel Contreras, está preso e sentenciado a 12 anos
por atrocidades contra os direitos humanos. As rodas da
Justiça no Chile têm se movido devagar, mas andaram
mais do que qualquer outro
país latino-americano.
FOLHA - Há novidades sobre a
participação dos EUA desde o lançamento do seu livro?
KORNBLUH - Depois do livro,
houve documentos adicionais, nós obtivemos o acesso
às teleconferências de Kissinger. Uma delas diz tudo
sobre o papel dos EUA no
Chile. Nixon chamou Kissinger cinco dias após o golpe, e
tiveram a primeira longa
conversa sobre o golpe. Nixon pergunta: "Nossa ajuda é
visível?". Kissinger responde: "Nós não fizemos. Quero
dizer, nós os ajudamos". Há
uma palavra apagada, e a frase continua: "Criamos as
condições o mais rápido possível". Isso mostra que os
EUA criaram secretamente
condições para o golpe.
FOLHA - O que mais não se sabe
sobre o envolvimento dos EUA no
golpe e no regime de Pinochet?
KORNBLUH - Há vários documentos da CIA sobre pagamentos a militares chilenos,
contatos e comunicações
ocorridos depois do golpe, o
programa específico da CIA
para ajudar o Pinochet a
criar uma polícia secreta. Há
muita coisa que não sabemos
sobre o conhecimento da
CIA sobre a Operação Condor, o esquema internacional de operação de Pinochet.
A Operação Condor usou as
mesmas técnicas que o governo Bush usou recentemente, centros de detenção
secretos, tortura e desaparecimentos e prisões sem habeas corpus.
FOLHA - E sobre a Operação
Condor, o que falta descobrir?
KORNBLUH - Sabemos que Pinochet e seu chefe de inteligência, Manuel Contreras,
criaram a Operação Condor
no outono de 1975, quando
houve um encontro secreto
em Santiago. Houve um segundo encontro em Santiago, em junho de 1976. Mas há
muitas coisas que não sabemos. Não temos todos os arquivos do envolvimento brasileiro, por exemplo. O Brasil
enviou representantes a esses encontros, e esses representantes, sem dúvida, voltaram ao seu país e escreveram
relatórios sobre o que foi discutido. Não sabemos como
foi o debate entre os militares brasileiros sobre o grau
de participação na Operação
Condor. Há alguns indícios
em documentos da CIA de
que o Brasil tinha a intenção
de ajudar a Condor com o sistema de comunicação, mas
não queria fazer parte da
equipe de assassinato que os
países envolvidos estavam
enviado pelo mundo para eliminar seus críticos.
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